Poesia de agora: SOBRE OS DIAS – Pat Andrade

SOBRE OS DIAS

há dias em que preciso traduzir-me
para mim mesma
mas não encontro
quem fale a minha língua

há dias em que o espelho não me vê
e não posso me olhar
de longe não me vejo
e de perto não me suporto

há dias em que o sol não me alcança
e não me aquece
e sou nublada e fria
como uma manhã de inverno

há dias em que me procuro em vão
devo estar perdida
em pensamentos náufragos
em ilhas de solidão

Pat Andrade

Poesia de agora: Sobre o amor que eu quero – Pat Andrade

Sobre o amor que eu quero

cansei do amor não vivido
quero o amor declarado
explícito
chega do amor platônico
quero o amor da carne,
do espírito

nada de amor virtual
quero o amor ao vivo
em tempo real
nunca mais o amor que sofre
quero o amor que se alegra
sem igual

também não quero o amor calado
quero o amor que canta,
apaixonado

quero o amor insano,
o louco amor dos desesperados

o amor maior, você e eu,
de braços dados.

Pat Andrade

Poesia de agora: Poeminha Cansado – Pat Andrade

POEMINHA CANSADO

parei de fazer promessas
que não posso cumprir
minha alma está cansada

evito pessoas e lugares
ignoro frustrações
sublimo dores
sobrevivo aos dias
ouço as mesmas canções

do ácido ao lírico
tudo vira delírio

de agora em diante
sob alheios olhares
preparo calmamente
rascunhos descartáveis
de frenesi e poesia

Pat Andrade

Poesia de agora: O homem que chovia – Pat Andrade

O homem que chovia

O homem de guarda-chuva
Chovia pelos meus caminhos.
Sem hora pra chover,
Chovia de manhãzinha
De tarde, à noite,
Alta madrugada…
Chovia por aí…
Um dia, este homem
choveu dentro de mim…

Pat Andrade

Parada Literária: a poesia invade o cotidiano da cidade

A poeta Pat Andrade iniciou esta semana o projeto “Parada Literária”, ao lado do músico Marcelo Abreu. A iniciativa consiste na intervenção poética em vários pontos da cidade, incluindo paradas de ônibus e praças. O objetivo é disseminar a poesia em todos os cantos de Macapá.

A linguagem urbana da poesia cotidiana de Pat Andrade vem acompanhada dos sons da caixa de marabaixo – tocada por Marcelo Abreu, trazendo a força ancestral da música tradicional do Amapá.

A realidade que choca, a crítica social, o amor e a exuberância da natureza tucuju também estão presentes nos poemas escolhidos para cada apresentação.

O projeto conta com apoio da Secretaria de Estado da Cultura, por meio da Lei Aldir Blanc, que contemplou o “Parada Literária” através do EDITAL Nº 009/2020 – SECULT – “PIMPOLHO SANCHES” Fomento a Programas, Projetos e Ações Artísticas e Culturais Continuadas.

Siga o “Parada Literária” nas redes sociais para mais informações e apoie a iniciativa poética-cultural:

Site: https://www.ocaproducoesap.com.br/
Facebook: https://www.facebook.com/ocaproducoesap
Instagram: https://www.instagram.com/ocaproducoesap/
Youtube: https://www.youtube.com/channel/UC2tzAkof21qP6pQMvIkJExQ

Fotos: Aog Rocha.
Texto: Assessoria de comunicação do projeto Parada Literária. 

Poema de agora: Anatomia da Saudade – Pat Andrade

Anatomia da Saudade

a saudade meu bem
brota aqui dentro de mim
lá no fundo do coração
por causa do lobo temporal

vem de uma lembrança antiga
de uma voz ou de uma canção
que o vento traz
um cheiro peculiar
que invade o ar

aí inventa cisco no olho
faz cosquinha
na ponta dos dedos
caminha pelo corpo inteiro

depois brinca de se esconder
na coleção de pedrinhas redondas
na flor amassada dentro do livro
num poema escrito aos seis anos

do nada vira foto borrada
faz a gente morrer um pouco
com a dor revisitada

a saudade meu bem
é uma ferroada invisível
que às vezes dói
e às vezes arde
é bicho que anda
sem ter pernas
voa sem ter asas
e canta implacável
nos fins de tarde

Pat Andrade

Poema de agora: UMA MULHER – Pat Andrade

Pat Andrade – Foto: arquivo pessoal da poeta.

UMA MULHER

não sou vítima
e não aceito o carrasco
que me castiga
não sou objeto
e não aperto a mão
que me bolina
não sou escrava
e não nasci pra te servir

não sou perfeita
e não acato os padrões apodrecidos do high society
não sou deusa
e dispenso teus altares

não sou dondoca
não sou boneca
nem tua gostosa
não sou louca
nem doida varrida
como tentas insinuar

quero e mereço respeito

sou uma mulher
e isso deve bastar

Pat Andrade

Poema de agora: Uma cidade no meio do mundo – Pat Andrade

Fotos: Raimundo Manoel Fonseca

Uma cidade no meio do mundo

a cidade que mora em mim
reside entre a igreja e o teatro
se reflete nas águas do lago
caminha pela serrano
e corre pela independência
até o meio do mundo

essa cidade
embriaga-se de rio
e renasce na floresta
toma açaí do grosso
come camarão no bafo
mata a sede com água de poço

é essa cidade
que ama as mulheres do igarapé
dança marabaixo e batuque
no largo dos inocentes
e dorme tranquila
nos braços de São José

Pat Andrade

Poema de agora: AVE NOTURNA – Patrícia Andrade

AVE NOTURNA

trago versos conturbados
atravesso as madrugadas
sem dormir
sonho acordada
com as coisas
que ainda não vivi

o pensamento voa
ganha vida própria
e sai por aí
invadindo áreas restritas
ruas desertas
casas alheias
corações vazios

há tempos
em que meu verso
é ave noturna
sem paradeiro ou destino
é pássaro triste
que rasga a mortalha
ao soarem os sinos

Patrícia Andrade

Poesia de agora: sexo literal – Pat Andrade

sexo literal

e veio a palavra beijar-me a boca
enfiou em mim sua língua
usou muitos substantivos
deu-me adjetivos
causou-me advérbios

depois de rápida análise
entreguei-me aos seus verbos
apaixonei-me por tempos e modos
me envolvi com sua semântica
lambi cada fonema

encantada com seus significados
vencida por suas conjugações
não tive dúvidas…
fiz amor com ela

Pat Andrade

Poema de agora: SONOROS DESTINOS – Marcelo Abreu e Pat Andrade

SONOROS DESTINOS

palavras ao vento
reverberam num poema
que veio vindo de longe

a vida estendida
num quaradouro
espera ávida
pelo voo da arara

nossas novas roupas velhas
penduradas no varal
enchem as auroras de cor

novos acordes ecoam
em metais e sons etéreos

dançamos felizes na floresta
sob o rufar dos tambores

enquanto a noite não vem
traçamos nossos destinos
no soar dos trovões

Marcelo Abreu e Pat Andrade

Poesia de agora: O ÓBVIO – Pat Andrade

O ÓBVIO

ainda que arrancassem meus olhos
não deixaria de enxergar
o desespero do cotidiano
pelas esquinas
bancos comércios
baixadas prédios

toda a desilusão
devidamente contida
caprichosamente disfarçada

os carros passam indiferentes
há uma morbidez aparente
e a poesia manifesta

somos mortos vivos
implorando por dias mágicos
músicas etéreas
pratos colossais

estamos à beira do caos

somos míseros poetas
rabiscando diante do cais
a desejar mares e horizontes
que não podemos alcançar

somos pássaros tristes
que mesmo fora da gaiola
perderam a vontade de voar

Pat Andrade

Poesia de agora: POEMA-CANÇÃO

POEMA-CANÇÃO

nosso amor é feito
de manhãs azuis
e tardes ensolaradas
de segredos divididos
e dores compartilhadas

nosso amor é feito
de areias quentes
e águas geladas
de roda gigante
sorvete e mãos dadas

nosso amor é feito
de bilhetes e canções
de doçura e nostalgia
de sonhos guardados
de samba e poesia

Pat Andrade

Poesia de sexta: Anoiteço – Pat Andrade

Anoiteço

quando eu
te madrugava,
mesmo as noites sem lua
não pareciam assim
tão escuras

já não te amanheço,
e os dias têm sido
cada vez mais cinzentos

agora, quando entardece,
logo, logo,
anoiteço…

Pat Andrade