Poesia de agora: POEMA-CANÇÃO

POEMA-CANÇÃO

nosso amor é feito
de manhãs azuis
e tardes ensolaradas
de segredos divididos
e dores compartilhadas

nosso amor é feito
de areias quentes
e águas geladas
de roda gigante
sorvete e mãos dadas

nosso amor é feito
de bilhetes e canções
de doçura e nostalgia
de sonhos guardados
de samba e poesia

Pat Andrade

Poesia de sexta: Anoiteço – Pat Andrade

Anoiteço

quando eu
te madrugava,
mesmo as noites sem lua
não pareciam assim
tão escuras

já não te amanheço,
e os dias têm sido
cada vez mais cinzentos

agora, quando entardece,
logo, logo,
anoiteço…

Pat Andrade

Poesia de agora: MUDEZ – Patrícia Andrade

MUDEZ

me faltam palavras
mesmo que o coração
fale aos berros
dentro do peito

minha boca se cala
ainda que meu corpo
grite e sinta o arrepio
em cada pelo

me falta a voz
ainda que o sentimento
se manifeste em mim
meio sem jeito

e sem conseguir
dizer o que quero
sigo assim muda
a te olhar pelo espelho

Pat Andrade

Poesia de agora: No Tribunal – Pat Andrade

No Tribunal

meus crimes:
amar amores,
chorar dores
ignorar tristeza
elogiar beleza
gritar alegria
respeitar ironia
sonhar de noite
dormir de dia
meu júri:
a indiferença,
a ignorância,
a hipocrisia.
minha pena:
a da poesia.

Pat Andrade

Poesia de agora: Tarde de verão – Pat Andrade

 


Tarde de verão

Tarde de verão
a árvore estendia
para um céu azul
seus galhos nus
de longe o menino
encantado assistia
aquela cena
e pensava que bem que podia
ser uma prece, uma oração,
mas acabou virando poesia

Pat Andrade

Poema de agora: BRASILEIRO –  Pat Andrade

BRASILEIRO

até ontem
eu estava empregado
era humilhante
mas tinha um trabalho

um salário de fome
mal dava pra comer
uma novela pra receber
todo mês um atraso
toda hora uma bronca
toda semana uma desculpa
vai acabar o contrato
não veio o repasse
são tempos de crise
eu que entenda
eu que aceite
se não quiser
há quem precise

humilhação todo dia
mas eu tinha um trabalho

tenho família
que mora comigo
mulher e três filhos
mais minha sogra
e um cachorrinho
fui demitido
por causa da pandemia

hoje padeço na fila do banco
sem trabalho sem perspectiva
continuo humilhado

agora sou só mais um dado
incluído nas estatísticas

Pat Andrade

Poesia de agora: poeminha irrequieto – Pat Andrade

poeminha irrequieto

estendi minha poesia na janela
pra ver se aquecia o coração
mas não veio nem sol, nem calor…

ansiei desesperadamente pela chuva
para ver se refrescava a alma
mas não veio água, nem nuvem…

chateada, guardei a poesia na gaveta
pra ver se ela esquecia do que há de ruim.

mas é tão irrequieta que se livrou de lá
e voltou correndo pra dentro do peito
e não para de me cutucar

mas diz que não sai, de jeito nenhum…

vou esperar que fique mansa,
que se acomode…

quando estiver distraída,
agarro-a pelo primeiro verso
e boto pra fora,
até a última rima

Pat Andrade

Poema de agora: FOGO BRANDO – Pat Andrade

FOGO BRANDO

cortaram
sua existência
pela metade

no cartaz
mal escrito e tosco
a curta história de vida
em cada linha do rosto
um sorriso que foi roubado

o mundo virou-lhe
as costas
arrancaram-lhe
a dignidade
falta-lhe a cama
e a mesa
não tem endereço
nem identidade

o semáforo
lhe rouba o tempo

deixa o ponto
de mãos vazias
volta pra casa
a passos lentos
pensando na vida
sem jeito

hoje é mais um dia
em que vai cozinhar
apenas desespero

Pat Andrade

Vídeopoema de agora: AMORTE – Ori Fonseca (declamação de Patrícia Andrade)

AMORTE

O amor, soterrado, agoniza e grita,
Ninguém o socorre, estão distraídos
Co’a pressa errante da vida finita,
Com seus devidos impostos devidos,
Enquanto o coração não mais palpita,
E as emoções definham sem sentidos.
O frio da solidão me faz cansado,
Não ouço os gritos do amor soterrado.
O amor, faminto, sai de porta em porta
Pedindo um sonho que lhe mate a fome,
Mas a fome do amor não mais importa,
Não existe o alimento que o amor come
Na veia que é sem sangue, na alma morta,
Num sentimento que não tem nem nome.
O frio da solidão gela o que sinto,
E eu ignoro a fome do amor faminto.
O amor, doente, dorme na calçada,
E come o pão que o diabo amassou.
A vida já lhe foi mais abastada,
Naquele tempo em que mais gente amou,
Mas tudo que era tudo agora é nada,
O doce, por ser doce, se acabou.
O frio da solidão é frio dormente,
Não sei sentir a dor do amor doente.
O amor, deprimido, sufoca o pranto,
Resmunga baixinho na noite alta,
O gozo da vida, que lhe foi tanto,
É tudo o que agora lhe faz mais falta;
O medo que assombra no escuro canto,
O assombro do medo que sobressalta.
O frio da solidão geme um ganido,
Sou surdo ao choro do amor deprimido.
O amor, natimorto, não verá o dia,
Não brincará na boca dos amantes,
Não sentirá o perfume da alegria
Nem os calores das paixões vibrantes;
E tudo enfim será paralisia;
Sem lua nem sol, sem depois nem antes.
O frio da solidão cala-me absorto,
E eu beijo a testa do amor natimorto.

Ori Fonseca – (declamação de Patrícia Andrade)

Poesia de agora: SOBRE AUSÊNCIAS – Pat Andrade

SOBRE AUSÊNCIAS

esses silêncios
insondáveis
esses hiatos
impenetráveis
te levam
pra longe de mim

essas curtas
ausências
essas pequenas
distâncias
me dão a medida
da tua existência

me desconcertam
me desconcentram
me deixam no vácuo
do sentimento

me arrasto pra ti
a passos lentos
me arrisco
em teus precipícios
e reinicio
o movimento

sem cansaço
liberto o brado

ecoo nesse vazio
ilimitado

PAT ANDRADE

Sobre Vivência é o novo livro virtual da poeta Pat Andrade

Sobrevivência é palavra de ordem nestes tempos. Sobre Vivência é o novo livro virtual da poeta Pat Andrade

Pat se assume como poeta amazônida, assina neste Blog a coluna Caleidoscópio da Pat, onde publica poemas e crônicas. Ela tem poesia e prosa publicadas em várias coletâneas; entre elas, podemos citar Jaçanã – Poética sobre as águas, da editora Pará.Grafo, de Bragança.

A poeta é também artista plástica, integrante do Grupo Urucum – um dos mais antigos coletivos de arte do Norte do país.

Este trabalho é o seu sexto livrinho virtual publicado durante a pandemia; traz poemas atuais e aborda temas do cotidiano – uma das marcas da poesia da Pat.

A poeta tem um jeito peculiar de comercializar seus livros. Cada pessoa que adquire um exemplar é que resolve quanto vai pagar por ele. Segundo ela, “o valor do livro está entre o que o coração manda e o bolso permite”.