Poema de agora: ALGO QUE PENSO SOBRE A CHUVA – Marven Junius Franklin

ALGO QUE PENSO SOBRE A CHUVA

nesse exato instante
em que resolvo
– a duras penas –
romper com a mesmice
dos bate-bocas enfadonhos

decido
– de pronto –
tomar banho de chuva
no percurso entre
a minha casa e o bar

algo como me depurar
e dizer:
la puie est comme des larmes!

Não entendo
– confesso –
o que proferem as religiões

(as horas para mim
correm ao contrario
– como o voo absurdo
das andorinhas sem bando)

e o véu que camufla a solidão
é tênue como o brado de um
recém-injustiçado

assim
entre tempestades e tamarineiros
eu seguirei – pois vasta é a minha aflição
que não me deixará alcançar longevidade

e no limite do tempo
alguém virá atrás de mim
– ponderara coisas absurdas sobre
amizade

(ficarei em silêncio
e responderei com uma a poesia livre
– como prometido!!

Marven Junius Franklin

Poema de agora: Rima lógica – Pat Andrade

Rima lógica

Quando penso que sou única,
Me sinto mágica,
Me ouço música.
Quando penso que sou lúdica,
Me sinto sátira,
Me vejo lúbrica.
Quando penso que sou tácita,
Me sinto lépida,
Me faço cênica…

[…]

Quando penso que sou lógica,
Me sinto métrica
E me perco em rima.

Pat Andrade

Poema de agora: Suíte…para sobreviventes dos inseticidas bioorganofosforados – Luiz Jorge Ferreira

Suíte…para sobreviventes dos inseticidas bioorganofosforados

Entre nós um revoar de asas escuras cujo o dono esta vestido a rigor…
Adiante uma carcaça magra de um búfalo agora couro, e ossos.
Eu poderia estar em uma Metrópole Indiana.


Eu poderia estar em Gotham City.
Ou sentado a beira do cais de Ananindeua…ouvindo The Marmalade.
Ou simplesmente O Grupo Paçoca cantar Alfredo Reis…


Mas assobio Rita Lee, e gargalho Elis.
Nem par nem ímpar, estou indo de carro entre Osasco e Carapicuíba…


Na companhia de uma formiga saúva, e um raio de sol meio Cannabis que não sabe onde pousa, e escolhe uma barra de chocolate Nestlé
doida para se sentir mordida…


Ando meio Mutante impressionado com a brincadeira de Deus, ao espalhar o todo ao redor do nada.
Quem sabe a formiga saúva…ache que encontrou Deus em mim, e eu seja a criação que a colônia que a pós em um

foguete Atlas 49…com asas supersônicas.
Esperasse encontrar.


Ela me sacode as antenas, talvez fale por meio de ondas cicloeletrônicas de alta intensidade.
O raio de sol pisca intermitente…
Por acaso me acha uma saúva sob o teto do Golf 2010…
Que para a indignação de quem acelera …morre no início da ladeira…

Luiz Jorge Ferreira

* Do livro de Poemas “Nunca mais vou sair de mim sem levar as Asas” – Rumo Editorial – São Paulo.

Poema de agora: MEU BARCO AVARIADO – Joãozinho Gomes

Joãozinho Gomes – Foto: Ricardo Prado

MEU BARCO AVARIADO

A peste tem nos emprestado
e a tempestade à têmpora da aurora
não contemporiza-se a dor
da tua âncora aos corais.
Meu barco às pedras encalhado
Posseidon cedo pôs
seu dom a balouçar-te, nem Eufemo
o demoveu de libertar o réptil
para engendrar o nosso rapto
e Poriclimeno o viu decrépito
e eu o nominei, o Crápula
e Calipto o chamou de mentecapto.
Ecrepto, o Apto, o deus Apito
optou por abafar os gritos e o ranger
da tua quilha a roçar-se
a Argo naufragada a esta ilha
à oeste do infinito.
A peste tem nos emprestado
e a tempestade à têmpora da aurora
não basta ao escamoso mito.
Meu barco com o casco avariado
como chegaremos ao Egito?

Joãozinho Gomes

Poema de agora: AMAZÔNICA ELEGÂNCIA – Obdias Araújo (para Joãozinho Gomes)

Poeta Joãozinho Gomes – Foto surrpiada da página da rede social Facebook (do poeta Obdias Araújo)

AMAZÔNICA ELEGÂNCIA

Eu queria muito ver
O meu amigo Joãozinho Gomes
Com uma daquelas calças brancas
Com elástico e bolso à altura dos joelhos.
Aquelas que terminam antes de
Chegar aos pés.
Pés estes displicentemente
Inquietos em chinelas de dedo.

E camisa branca de um botão
Lá perto do gogó
Fechando o bordado.
Cotton.

Pendurada no ombro esquerdo
A bolsinha de pano branca
Com zíper de plástico.
Uma alça enooorme na bolsa.
Eu queria
Muito ver…

Um dia
Quando eu frequentava ainda
A Lâmpada dos Gênios
Estive na casa do Poeta.

Na cama grande no quarto
Ainda sem portas João deitado
De bruços catava
Com dois dedos a poesia escondida
Nos entrelins de
Uma velha caderneta.
Com a mão esquerda pilava
Rimas e métricas para dar
Veracidade ao poema.

Ao lado um daqueles
Cabides em pé
E as alpercatas .
No cabide a calça a bolsa
E a camisa.

Na bolsa dois comprimidos para
Cefaléia algumas moedas
E um poema
Novinho em folha
Aquecido na colcha do poeta!

João Batista Gomes Filho
Faz sessenta e dois
Oito meses depois de mim.
Mas isso
Foi em Santa Maria do Pará.

Aqui em Macapá
Joãozinho Gomes nasce
Todo dia santo!
Todo santo dia!

Obdias Araújo

O Dia da Criação – Vinícius de Moraes (Porque hoje é sábado!)

O Dia da Criação (Porque hoje é sábado!)

“Neste momento há um casamento
Porque hoje é sábado.
Há um divórcio e um violamento
Porque hoje é sábado.
Há um homem rico que se mata
Porque hoje é sábado.
Há um incesto e uma regata
Porque hoje é sábado.
Há um espetáculo de gala
Porque hoje é sábado.
Há uma mulher que apanha e cala
Porque hoje é sábado.
Há um renovar-se de esperanças
Porque hoje é sábado.
Há uma profunda discordância
Porque hoje é sábado.
Há um sedutor que tomba morto
Porque hoje é sábado.
Há um grande espírito de porco
Porque hoje é sábado.
Há uma mulher que vira homem
Porque hoje é sábado.
Há criancinhas que não comem
Porque hoje é sábado.
Há um piquenique de políticos
Porque hoje é sábado.
Há um grande acréscimo de sífilis
Porque hoje é sábado.
Há um ariano e uma mulata
Porque hoje é sábado.
Há um tensão inusitada
Porque hoje é sábado.
Há adolescências seminuas
Porque hoje é sábado.
Há um vampiro pelas ruas
Porque hoje é sábado.
Há um grande aumento no consumo
Porque hoje é sábado.
Há um noivo louco de ciúmes
Porque hoje é sábado.
Há um garden-party na cadeia
Porque hoje é sábado.
Há uma impassível lua cheia
Porque hoje é sábado.
Há damas de todas as classes
Porque hoje é sábado.
Umas difíceis, outras fáceis
Porque hoje é sábado.
Há um beber e um dar sem conta
Porque hoje é sábado.
Há uma infeliz que vai de tonta
Porque hoje é sábado.
Há um padre passeando à paisana
Porque hoje é sábado.
Há um frenesi de dar banana
Porque hoje é sábado.
Há a sensação angustiante
Porque hoje é sábado.
De uma mulher dentro de um homem
Porque hoje é sábado.
Há a comemoração fantástica
Porque hoje é sábado.
Da primeira cirurgia plástica
Porque hoje é sábado.
E dando os trâmites por findos
Porque hoje é sábado.
Há a perspectiva do domingo
Porque hoje é sábado”

Vinícius de Moraes

Poema de agora: A RIMA DOS CONDENADOS (*) – Sílvio Leopoldo Lima Costa (**) – Contribuição de Fernando Canto

A RIMA DOS CONDENADOS

A rima dos condenados
É a rima de mangue sangue
Rimando com o bangue bangue
Dos homens desajustados.
A rima dos condenados
É a rima dos enfermos
Suspirando os últimos termos
Nos leitos desenganados.


A rima dos condenados
É a rima dos patíbulos
Rimando com os prostíbulos
Dos seios dilacerados.
A rima dos condenados
É a rima dos dementes,
Dos velhos, dos indigentes,
Pelos seus abandonados.
A rima dos condenados
É a rima de Hiroshima
Que por si já traz a rima
Dos eternos mutilados.
Rimará custo de vida
Com os bolsos defasados
Rimará pena de morte
Com a sorte dos humilhados.


Rimará punhal agudo
No peito do desafeto,
Rimará censura e veto
E o medo me deixa mudo.
Rimará o amor traído
Rimará muita descrença,
Rimará o céu de juízo
E a discriminada sentença.
Rimarão filhos da fome
Os corrompidos e os viciados


Que a rima dos condenados
É tudo o que nos consome.
É tudo o que se afigura
A nos pungir, revoltados,
A senha da desventura!
A rima dos condenados!

Sílvio Leopoldo Lima Costa

 

(*) Da Antologia “Poetas Brasileiros de Hoje”, Ed. Shogun Arte, Rio, 1982.
(**) Poeta amapaense, autor de “Lira Ligeira” e “Poemas do Fundo da Gaveta”, entre outros.
(***)Contribuição de Fernando Canto

Poema de Pat Andrade é selecionado para a 15ª edição da Revista Literalivre

A poeta Pat Andrade, colaboradora do Blog De Rocha!, teve seu poema “Pena perpétua” selecionado para a 15ª edição da Revista Literalivre, que é uma publicação brasileira de periodicidade bimestral, com distribuição eletrônica em PDF e totalmente gratuita.

Pat Andrade

A Literalivre trabalha com o intuito principal de dar espaço aos escritores e artistas de todos os lugares, amadores ou profissionais, publicados ou não, que desejam divulgar seus escritos e mostrar seu talento de forma independente e livre.

No momento, está no ar a 14ª edição. A 15ª será publicada até o final do mês de maio. Saquem aqui: http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre

Pena perpétua

o poeta aprisiona
não precisa
de corda,
grade ou algema…
o poeta prende
pela palavra
e sua pena.

(Pat Andrade)

Parabéns, Pat!

Poema de agora: Circulando em círculos – Luiz Jorge Ferreira

Circulando em círculos.

…sou Caetanogil sou mano oposto se agosto sou ano tempo sem pátria dia de aula igualmente engano de todo o dia sou bola sou pé ante pés de Cristo


mendigo roto coto da perna direita torta pronto para o apronto do Carnaval sou mal e malsendo sou muito feio mesmo atrás do espelho virado de costas sou absurdamente o avesso o iniciado no fim e o princípio adiado estou afinado com palavras travessas da falada alma afogo a sede e adiante

sou tão o mesmo que posso parecer outro o que mais carece o que sendo mais prece é corpo e sexo mais dentro
trago impresso o lado negro aceito pelo lado de fora fantasia tola de um fantasma albino e pueril.
…né mana…

Luiz Jorge Ferreira

* Do livro de Poemas “Nunca mais vou sair de mim sem levar as Asas” – Rumo Editorial – São Paulo.

Nesta sexta-feira (17), rola o lançamento da antologia “Semente na Educação” na Biblioteca Pública Elcy Lacerda

Nesta sexta-feira (17), às 18h, na Biblioteca Pública Elcy Lacerda, ocorrerá o lançamento do livro “Semente na Educação”. A antologia reúne textos de 11 (onze) professores escritores. A obra foi escrita em dois gêneros, prosa e poesia. O evento integra a programação da 17ª Semana Nacional de Museus. A entrada será franca.

O evento foi organizado pelos escritores Lenilson Silva e Leacide Moura, com o objetivo de oportunizar que colegas professores pudessem colocar seus escritos à disposição dos leitores amapaenses e também para que o público possa conhecer novos autores e estilos.

De acordo com a escritora Leacide Moura, que também possui material na antologia, os textos em prosa retratam temáticas regionais amazônicas, de Macapá, Santana e localidades do estado do Amapá; as poesias buscam temáticas diversas, com apanhados no social, regional e universal.

Essa antologia é muito especial para os professores, que guardavam textos nas gavetas, e esta obra têm a felicidade de publica-los. A linguagem é simples, com uso da norma culta e empréstimos da cultura regional no empoderamento do encanto das palavras que conquistam a atenção do leitor”, pontuou Leacide Moura.

Além de Leacide, há outros 10 professores escritores da antologia Semente da Educação. São eles: Fabio Nescal, Amanda Moura, Ana Valéria Oliveira, Annie de Carvalho, Selma Vieira, Afonso Colares, Iramel Lima, Thayná Oliveira, Patrick Oliveira e Santiago Júnior.

Serviço:

Lançamento do livro Semente na Educação, dos professores escritores Leacide Moura e Lenilson Silva
Data: 17 de maio de 2019
Horário: 18h
Local: Biblioteca Elcy Lacerda, que fica na Rua São José, 1800, centro de Macapá.
Entrada: franca.

Elton Tavares, com informações da escritora Leacide Moura.

Poema de agora: SAFRA PERMANENTE (*) – Fernando Canto

SAFRA PERMANENTE (*)

Urge dizer a todos que te amo
e me alastrar, sôfrego, à tua procura diária
falar aos quatro cantos que o amor é necessário
na aventura floral desses caminhos
e que o rio transborda, seca e deixa restos
porque sou resíduo de ti,
que me semeias e me acendes
em busca de um novo tempo.

Tu és fêmea, e como tal carregas, de milênios,
a inconclusa compreensão concebida no teu útero,
estigma mundano – do homem – o preconceito.
Não seria fortuita a insaciável renitência dos olhares
que nos tangem – céticos – a mover pálpebras,
Seria por certo a espelhação daquelas almas
conflitantes e inseguras
Na absoluta podridão de suas mazelas.

Perfurados ou não, nós nos cerzimos
rasgados ou não, nos costuramos,
temos tempo para usar borracha e corrigir
o desenho do futuro – arte coloquial que criticamos
desde a configuração abstrata
delineada no passado.

Faz-se urgente empanar a couve-flor, enrolar charutos turcos e beber vinho do porto.
A água está no copo de alumínio para tirar a espinha atravessada na garganta Pois o rio dá de comer e o peixe não tem culpa desta fome incontrolável.

Decididamente tenho que gritar acompanhando o vento
ainda que me vire de repente,
pois a alastração do meu amor por ti é inevitável
é profusa, é disseminadora.

“Quem é esse?” Hão de inquirir, procurando mais motivos:
– Ofiófago, furfurácio, bucéfalo, hendecágono, biltre,
escatológico, onívoro, herbicida, satrapanca, hetacombático,
súcio, teratológico, celeumático, metacromático, tabífico,
santiâmem, ovovivíparo, safilítrico, tribático, safídico,
troglodítico, tranchucho, safardana…?
Ou ainda: – Onírico? Um pássaro? Um avião?

– Pelos poderes dos heróis no limite dos quadrinhos e dos desenhos animados, eu tenho o sonho!
A força desmedida e crua – extensão do meu amor.

Por essa ambientação do cosmo que transformo
O sal em sol
O sol em sonho
O sonho em safra permanente de existência.

E não haverá ritmo ou canção:
o brilho desse amor estará preso ao laço
que se ampliará conforme o tempo.
A chuva pingará o essencial nas estranhas da terra
e ela germinará para que vingue a flor
e a flor perfumará o necessário para estimular os sentidos
todos eles, inclusive aquele
inventado à noite para que o sonho sobreviva na memória, de manhã.

Fernando Canto

(*) Escrito em dezembro de 1986. Achado por estes dias em uma pasta azul, de papel com elástico.

Poema de agora: CAPÍTULO DA BALEIA – @PedroStkls1

CAPÍTULO DA BALEIA

um poema começado pelo fim
feito águas que não voltam
aquela coisa que move o coração
que deixa a casa da poesia
revirada pelo avesso
você me diz que a poesia
agora é vendida a preço de banana
que nada acontece
na fronteira do amor
ou no tráfego das estrelas
eu te olho com os olhos
da falta de crença


eu te olho como quem acredita
na poética pobre
que bate nas portas alheias
oferecendo um verso cansado
uma rima pré-aquecida
e uma ideia presa ao semicírculo
da falta de contemplação
o protocolo aqui é outro
é o arrepio é o incêndio
é apagar o fogo


botando mais lenha na fogueira
abrindo as feridas antigas
recosturando dando pontos
que doam mais que antes
até deixar começar o processo
de cicatrização
e abrir e abrir até sangrar sangue novo
a poesia precisa de poetas de coragem
barulhentos o suficiente
para deixar o silêncio mudo
é preciso revirar palavras
metáforas ruídos golpes
vigas reflexos de vidros
e carcaça de sentimento


exposto contraluz
avesso e poeira de palavras
que falam sobre sol beijando mar
um poema que traduza
a morte de uma baleia
que veio sonhar o pra sempre
nas águas do amazonas
é preciso um ritual
é preciso um capítulo
sobre a mitologia da perda
uma baleia um poema
maior que o próprio ser poesia
só não vê poesia na morte da baleia
os que não acreditam
na salvação pela palavra
na cura pela transformação
é preciso imaginar aqui
por quais águas o corpo da baleia
agora vivo e destemido
seguiu até perder o sentido
até se perder da vida


o que sentiu pela última vez
o coração da baleia?
quando se cruza o amazonas
ou se vive ou se morre
morrer é sempre mais bonito
morrer tem um gosto de eterno
e a poesia enquanto fúria
ama tragédias inesperadas
você já imaginou como seria
o enterro da baleia?


como seria o seu nascer de novo?
um poema sobre uma baleia perdida
como um poema que sabe
a hora de voltar pra casa

Pedro Stkls