Poema de agora: Bem te vi – Manoel Fabrício – @ManoelFabricio1

Arte: Alex Sapiência

Bem te vi

Bem te vi tá cantando de madrugada
O calor não para de aumentar
O Rio cada vez mais poluído
Geração mercúrio
Nessa Amapá
É chuva de bala
E vida extinta
É panela vazia
Tão acuando a matinta?
– tem tabaco aí?
Nem sei corro ou se sorreio
Perdido perto do tiroteio
Helicóptero na altura da mangueira
O forro da igreja furado de bala

Manoel Fabrício

Randolfe lamenta 600 mil mortes causadas pela Covid-19 – @randolfeap

Foto: Pedro França/Agência Senado

Senadores lamentaram a marca de 600 mil mortes causadas pela Covid-19. Até a tarde da última sexta-feira (8), o Ministério da Saúde indicava que 599.810 brasileiros haviam morrido vítimas do novo coronavírus. Mas, segundo dados divulgados pelo consórcio de veículos de imprensa, em boletim extra, o Brasil chegou a 600.077 mortos pela Covid.

Em várias partes do Brasil, como na Praça dos Três Poderes em Brasília, atos lembraram as vidas perdidas. Pelas redes sociais, os senadores lamentaram as perdas e apontaram ineficiência do governo no combate à Covid-19.

Ao longo dos últimos meses, senadores como o vice-presidente da CPI da Pandemia, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), têm exibido placas com o número de vidas perdidas para a covid-19 no Brasil. Para Randolfe, a marca representa um momento triste para o País e tem relação com a estratégia adotada pelo governo no controle da pandemia.

“Hoje atingimos a triste marca de 600 mil óbitos. A maioria dessas mortes poderiam ser evitadas, caso a estratégia adotada pelo governo federal fosse diferente. Nossa solidariedade a cada um e cada uma neste momento. Também sentimos muita falta de nossos entes queridos”, lamentou o senador.

Fonte: Agência Senado.

Poema de agora: FUNDO FOSCO – Marcelo Abreu

FUNDO FOSCO

Nada muda
Nessa moda antiga
Nessa pátria muda
De sorrisos tristes
De abraços frios
De discursos mórbidos

Nada passa
Essa gente apática
De palavras bélicas
De hipocrisia farta
De bravura pífia

Nada finda
Na República elitista
No separatismo imposto
Nesse fundo fosco
De almas sem vidas

Nada alcança
Esse país sem fé
Sem esperança
Sem o ouro arbítrio
Sem o doce afago
Sem a grandeza
da inocência
de uma criança

Marcelo Abreu

A privatização do estado – Por Gian Danton – @giandanton

Por Gian Danton

Em recente entrevista, o ministro da economia Paulo Guedes afirmou que estima-se que metade do servidores públicos brasileiros vão se aposentar nos próximos quatro anos. Isso, claro, inclui policiais, professores, médicos. Mas ele avisa: não haverá concurso para substitui-los.

Essas áreas já sofrem com uma falta crônicas de profissionais, em especial a área de Educação. Na maioria das escolas os alunos passam meses sem aulas de algumas disciplinas por falta de professores.

A solução do governo parece ser jogar para o cidadão a obrigação que deveria ser do Estado. Prova disso é toda a campanha feita para promover a educação domiciliar e contra a educação pública gratuita.

O argumento é simples. Quer educação? Eduque seu filho em casa. Quer segurança? Compre uma arma. Quer saúde? Faça um plano de saúde. Quer aposentar? Faça um plano privado.

E isso em um dos países com maior carga tributária do mundo. Cerca de 40% de todo dinheiro que circula no Brasil vai para o governo. E a carga tributária não dá mostras de que vai diminuir. Como não houve correção da tabela do imposto de renda, este ano os brasileiros vão pagar mais imposto que em 2018.

Fonte: Ideais Jeca-Tatu.

Violência contra jornalistas cresce 105,77% em 2020, com Jair Bolsonaro liderando ataques

Maria José Braga: “ataques ocorrem para descredibilizar a imprensa para que parte da população continue se informando nas bolhas bolsonaristas, lugares de propagação de informações falsas e ou fraudulentas”

Em pleno ano da pandemia provocada pelo novo coronavírus, quando o Jornalismo foi considerado atividade essencial no país e no mundo, e os profissionais se desdobraram, muitas vezes em condições precárias, em busca da informação responsável e de qualidade para conter o avanço da doença, o Brasil registrou uma explosão de casos de violência contra os jornalistas.

Segundo o Relatório da Violência contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil – 2020, elaborado pela Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e lançado hoje (26/01) dentro das atividades do Fórum Social Mundial, o ano que passou foi o mais violento, desde o começo da década de 1990, quando a entidade sindical iniciou a série histórica. Foram 428 casos de ataques – incluindo dois assassinatos – o que representa um aumento de 105,77% em relação a 2019, ano em que também houve crescimento das violações à liberdade de imprensa no país.

Para a FENAJ, o aumento da violência está associado à ascensão de Jair Bolsonaro à Presidência da República e ao crescimento do bolsonarismo.

“Na avaliação da Federação Nacional dos Jornalistas esse crescimento está diretamente ligado ao bolsonarismo, movimento político de extrema-direta, capitaneado pelo presidente Jair Bolsonaro, que repercute na sociedade por meio dos seus seguidores. Houve um acréscimo não só de ataques gerais, mas de ataques por parte desse grupo que, naturalmente, agride como forma de controle da informação. Eles ocorrem para descredibilizar a imprensa para que parte da população continue se informando nas bolhas bolsonaristas, lugares de propagação de informações falsas e ou fraudulentas”, afirma Maria José Braga, presidenta da FENAJ, membra do Comitê Executivo da Federação Internacional dos Jornalistas (FIJ) e responsável pela análise dos dados.

A presidente também destaca que o registro, pelo segundo ano consecutivo, de duas mortes de jornalistas, “é evidência concreta de que há insegurança para o exercício da profissão no Brasil”.

Como no ano anterior, a descredibilização da imprensa foi uma das violências mais frequentes: 152 casos, o que representa 35,51% do total de 428 registros ao longo de 2020. Bolsonaro, mais uma vez, foi o principal agressor. Dos 152 casos de descredibilização do trabalho dos jornalistas, o presidente da República foi responsável por 142 episódios.

Sozinho, Jair Bolsonaro respondeu por 175 registros de violência contra a categoria (40,89% do total de 428 casos): 145 ataques genéricos e generalizados a veículos de comunicação e a jornalistas, 26 casos de agressões verbais, um de ameaça direta a jornalistas, uma ameaça à Globo e dois ataques à FENAJ.

Para a presidenta, a postura do presidente da República serve de incentivo para que seus auxiliares e apoiadores também adotem a violência contra jornalistas como prática recorrente.

Ataques virtuais e censuras aumentam

Também foi registrado aumento nos casos de Agressões verbais/ataques virtuais, com o crescimento de 280% em 2020 em comparação com o ano anterior, quando foram registrados 76 casos.

Para que o número geral de casos de violência contra jornalistas e ataques à liberdade de imprensa mais que dobrasse em 2020, destaca a presidenta, “houve crescimento em quase todos os tipos de violência”.

O aumento foi bastante expressivo ainda nas categorias de censuras (750% a mais) e agressões verbais/ataques virtuais (280% a mais).

Os jornalistas passaram a ser agredidos por populares e houve aumento nos casos de agressões físicas e de cerceamento à liberdade de imprensa por ações judiciais, o que também é muito preocupante na avaliação da Federação, afirma a presidenta.

Segundo o relatório, as agressões físicas eram a violência mais comum até 2018, depois diminuíram em 2019 e, em 2020, cresceram 113,33%.

Já os episódios de cerceamento à liberdade de imprensa por meio de ações judiciais subiram 220%: de cinco em 2019, para 16 casos, em 2020. Para a presidente, ano passado foram registrados dois casos preocupantes dessas duas formas de ataques – verbais e pelas vias judiciais – que agravam a preocupação da entidade com o futuro do jornalismo no Brasil. São os casos do jornalista Amaury Ribeiro Júnior, condenado à prisão pelo livro-reportagem A Privataria Tucana, e do professor de jornalismo do Rio Grande do Sul, Felipe Boff, agredido verbalmente durante discurso em uma colação de grau.

Violência por gênero e tipo de mídia

Os homens seguem sendo as maiores vítimas de violência contra jornalistas representando 65,34% dos casos, mas foi registrado também um aumento expressivo de ataques às mulheres.

“Os ataques verbais e virtuais contra as mulheres cresceram e sempre têm um caráter machista, misógino e com conotação literalmente sexual, o que é muitíssimo grave”, destaca Maria José Braga.

A maioria dos jornalistas agredidos fisicamente ao longo de 2020 são trabalhadores de emissoras de televisão. Eles representam 24,44% dos 77 casos.

Maria José disse que os números do relatório, mais uma vez, expressam a preocupação da Federação pois, mesmo sabendo que são subestimados, são bastante alarmantes. “Eles mostram a gravidade da situação e mostram que o Estado brasileiro que, antes era omisso no combate à violência contra jornalista, não tomando medidas efetivas para a proteção da categoria, agora, por meio da Presidência da República, é o principal agressor”.

Estado brasileiro passa de omisso a agressor

Maria José fez um apelo para que as instituições tomem providências enérgicas para que a violência seja investigada, combatida e punida, pois o Jornalismo e os jornalistas precisam do apoio da sociedade para seguir informando com responsabilidade e qualidade.

Ela lembrou que a FENAJ é uma das entidades signatárias de um pedido de impedimento do presidente por crime de responsabilidade contra o direito constitucional da liberdade de imprensa – parado na Câmara dos Deputados – e de uma ação por danos morais coletivos por causa dos ataques aos jornalistas, também sem resposta ainda do Judiciário.

O Relatório da Violência contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa – 2020 é elaborado anualmente a partir dos dados coletados pela própria Federação e pelos Sindicatos de Jornalistas existentes no país, a partir de denúncias públicas ou feitas às entidades de classe.

Fonte: FENAJ.

A situação TÁ FORD e a tendência é PIORAR! – Por Silvio Neto

Por Silvio Neto

A semana começou agitada e ainda com o gostinho amargo das más notícias de 2020: O Banco do Brasil anunciou, nesta segunda-feira (12/01), mais uma reestruturação que vai mexer com a vida de, pelo menos, 5 mil funcionários em todo o país. Serão 870 postos de atendimento fechados (incluindo agências e escritórios) e 243 agências transformadas em postos de atendimento (que agora se chamarão “lojas”). Além desses bancários, outros 5 mil trabalhadores da Ford ficarão sem emprego com o fechamento das 3 fábricas da gigante norte-americana que operam no país (uma no interior de São Paulo; uma no interior da Bahia e outra no interior do Ceará).

Mas podemos ficar todos tranquilos. Afinal, o Brasil que elegeu Bolsonaro em 2018 é um país de empreendedores. Assim, uma possibilidade seria: O pessoal da Ford no Ceará, monta uma grande companhia de humor ou um conglomerado de bandas de forró e arrocha. A turma da Bahia abre uma cooperativa para vender coco e o grupo de Taubaté cuida da logística dos artistas cearenses e dos vendedores de coco da Bahia. Daí, todo o dinheiro que conseguirem arrecadar pode ser investido numa corretora de investimentos cooperada montada pelos ex-bancários. Pronto! É a economia do nosso país cada vez mais forte! #SÓQUENÃO

O fato é que a situação está cada vez mais FORD e a tendência é piorar. Na verdade, a corja do Executivo está desmontando os poucos avanços no setor da indústria, que começavam a colocar o Brasil no hall dos melhores países emergentes, para transformá-lo novamente num país rural – mas não como outros grandes países que possuem um agrobusiness forte e, sim, aos moldes das antiquíssimas capitanias hereditárias.

Tendo que pagar os dotes da bancada ruralista, o governo brasileiro insiste em fazer do Brasil um país de insumos agropecuários, afugentando os grandes investidores dos outros setores (indústria e serviços) e desvalorizando a nossa moeda cada vez mais, a ponto do dólar não sair da casa dos R$5 e o euro da casa dos R$6.

Finalmente o plano do Paulo Guedes está dando certo: está chegando o dia que nenhuma empregada doméstica, nenhum metalúrgico e nenhum bancário poderá passear na Disney. Quem quiser que se contente em atravessar a fronteira da Argentina ou do Uruguai pra comprar seu Ford Ka.

*Silvio Neto é jornalista, pilota a blog “A Vida é Foda” e é um quase ex-bancário.

A verdade a ver navios… – Por Silvio Neto

Por Silvio Neto

O pronunciamento do ministro da saúde Eduardo Pazzuello, no último dia 6 de janeiro, não poderia ter sido mais vago e impreciso. Enquanto a maioria da população aguarda ansiosa pela chegada da vacina contra a Covid-19, o Governo Federal, na pessoa do ministro, fez um pronunciamento que se resumiu em incertezas, propaganda ideológica e dados que não dizem nada com nada.

O ministro começou tentando amenizar as piadas de mau gosto e as declarações espúrias do presidente: “[…] Em nome do presidente da República, Jair Bolsonaro, e de todo o Governo Federal, gostaria de iniciar este pronunciamento me solidarizando com todas as famílias que perderam seus entes queridos por causa da pandemia da Covid-19”. Foi comovente. Se ele já tivesse sido vacinado, teria caído uma lágrima de crocodilo (ou jacaré)…

Depois agradeceu aos profissionais de saúde, tentando valorizar uma instituição que há, bem pouco tempo, esteve na mira da privatização por este mesmo governo: “[…] Também gostaria de agradecer a todos os profissionais de saúde que atuam incansavelmente para salvar as vidas de nossos cidadãos. Graças à dimensão do Sistema Único de Saúde, o nosso SUS, mais de sete milhões de brasileiros estão recuperados”.

O próximo passo, depois de mostrar toda a sua humanidade e gratidão a quem realmente vem trabalhando durante toda a pandemia, foi lançar sutilmente a informação que todos esperavam: “[…] Agradeço, também, aos técnicos e a toda a nossa equipe do Ministério da Saúde que têm se empenhado para QUE A VACINAÇÃO ESTEJA À DISPOSIÇÃO DA POPULAÇÃO O MAIS RÁPIDO POSSÍVEL. Hoje, o Ministério da Saúde está preparado e estruturado em termos financeiros, organizacionais e logísticos para executar o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19. O BRASIL JÁ TEM DISPONÍVEIS CERCA DE 60 MILHÕES DE SERINGAS E AGULHAS NOS ESTADOS E MUNICÍPIOS. Ou seja, UM NÚMERO SUFICIENTE PARA INICIAR A VACINAÇÃO DA POPULAÇÃO AINDA NESTE MÊS DE JANEIRO”.

Mas, peraí, seu ministro! Quando é O MAIS RÁPIDO POSSÍVEL? – Não há resposta. E vejam que declaração feita com maestria para confundir a cabeça de todos que assistiram ao pronunciamento (inclusive a imprensa brasileira)! Com isso, só não enxerga quem não quer: Trocando em miúdos, o que o ministro disse foi que O BRASIL TEM SERINGAS E AGULHAS DISPONÍVEIS em NÚMERO SUFICIENTE PARA INICIAR A VACINAÇÃO EM JANEIRO. Mas a pergunta (sem resposta) é: QUANDO EM JANEIRO? EM QUE DATA? E, convenhamos, enquanto o Governo Federal não declarar oficialmente uma DATA, essa declaração não passa de mera especulação!

O ministro falou que o país vai receber seringas e agulhas nos próximos meses, mas a verdade é que uma data para o início da vacinação simplesmente NÃO EXISTE! O discurso foi todo construído em cima de promessas e especulações. NÃO TEMOS VACINA AINDA!

O resto do pronunciamento tratou de questões burocráticas como as negociações com a Pfizer e, talvez para remendar a declaração do presidente sobre o Brasil estar “quebrado”, o ministro deu uma leve esperança para aqueles que verdadeiramente importam para o governo – os investidores: “[…] seremos também EXPORTADORES DE VACINA para a nossa região MUITO EM BREVE”. Mas até mesmo os investidores devem estar se perguntando: MUITO EM BREVE, QUANDO, SEU MINISTRO?

E como não poderia deixar de acontecer em governos tendenciosamente autoritários, o ministro deu a notícia de que o presidente havia assinado uma MEDIDA PROVISÓRIA que trata de MEDIDAS EXCEPCIONAIS PARA AQUISIÇÃO DE VACINAS ANTES DO REGISTRO SANITÁRIO OU DA AUTORIZAÇÃO TEMPORÁRIA DE USO EMERGENCIAL PELA ANVISA. O curioso é que, até um dia antes do pronunciamento do ministro, praticamente, a Anvisa é que era a grande guardiã zeladora da segurança dos cidadãos. E, agora, parece que a entidade está se transformando no grande entrave contra a vacinação. Vai entender!

O populismo e o discurso ideológico não poderiam ficar de fora no pronunciamento do ministro, ao assegurar que “[…] TODOS OS ESTADOS E MUNICÍPIOS RECEBERÃO A VACINA DE FORMA SIMULTÂNEA, IGUALITÁRIA E PROPORCIONAL à sua população”. E, “no que depender do Ministério da Saúde e do presidente da República, A VACINA SERÁ GRATUITA E NÃO OBRIGATÓRIA”. Terminando, assim, o pronunciamento com um gostinho de fascismo escorrendo no canto da boca: “Brasil imunizado! Somos uma só nação! Muito obrigado”.

Seis dias se passaram e lá veio, hoje, o seu ministro dar mais uma notícia fantástica: “A VACINA VAI INICIAR NA HORA H E NO DIA D”!

Pronto! Agora, sim, temos uma data bastante razoável!

Hoje, viver no Brasil é bem parecido com viver num clipe de música dos anos 90 (dos Engenheiros do Hawaii): “Na hora H, no dia D, na hora de pagar pra ver, ninguém diz o que disse (não era bem assim). Na hora H, no dia D, na hora de acender a luz, ninguém dá nome aos bois (tudo fica pra depois)”… E a verdade, como sempre, fica a ver navios!

*Silvio Neto é jornalista e pilota o blog “A Vida é Foda” (aliás, recomendo, saquem lá).

POESIA NÃO DÁ VOTO (*) – Crônica de Fernando Canto

Crônica de Fernando Canto

Poucas vezes vi uma casa de shows lotada para ouvir poetas declamando seus textos como em um dia 25 passado, no Teatro das Bacabeiras. Por obra e graça de pessoas iluminadas como Carla Nobre e seu grupo, do movimento poético Abeporá das Palavras, aproximadamente vinte poetas mostraram suas poesias numa noite não muito longa, onde pouquíssimos espectadores saíram antes da hora. Ora, ouvir poesia depende de gostar muito. E tanta era a diversidade de estilo que só mesmo quem entende e gosta ficou até o final. Um final interessante, diga-se, pois contou com a participação especial do cantor e poeta guianense Moise Culture, que cantou um reggae, acompanhado pelos presentes. No mais a brilhante participação de Eliakim Rufino, poeta roraimense investido de mestre de cerimônia, fez do evento um espetáculo valorizado, onde os poetas convidados se tornaram estrelas como qualquer show-man num palco iluminado.

Talvez seja hora de fazer um balanço sobre a poesia amapaense. Por incrível que pareça raros são os livros editados anualmente em Macapá nessa área. Não obstante existir tantos poetas, conhecidos ou não, a ausência de divulgação da produção poética é patente. Não vi até hoje nenhum Governo do Estado, enquanto “incentivador da cultura”, promover e incentivar absolutamente nada para que esse segmento se tornasse até mesmo mais popular. Não fossem eventos como esse, os trabalhos escolares, as feiras e exposições periódicas dos colégios, é possível que nunca viéssemos a ter alguma produção nova, descobertas de talentos ou mesmo reafirmação de talentos já consagrados em nossa terra.

Se o trato que os setores competentes dessem à poesia (e à literatura de modo geral) como dão à música e ao teatro a coisa fatalmente mudaria de figuração. Nunca vi, reitero, nunca vi mesmo alguma instituição cultural oficial se preocupar com esse sonho louco de nefelibatas e doidivanas. Há quem diga que é preferível que esses malucos pratiquem suas salabórdias inúteis pelos cantos do que virem aborrecer os secretários e presidentes com suas artes não-recomendáveis para menores e pedir apoio para encherem a cara de cana. É, tem gente que ainda acha que a poesia é uma arte marginal, feita por marginais e viciados.

Felizmente convivi com os mais importantes poetas do Amapá. Até os mais velhos eu conheci pessoalmente. Destes, o único sobrevivente é o poeta concretista (nas décadas de 50 e 60) Ivo Torres, habitante da cidade do Rio de Janeiro e ainda na ativa com seus 77 anos. Tão honrado e sensível como ele foram os mestres Alcy Araújo, o prefaciador do meu primeiro livro, e Álvaro da Cunha, de quem guardo 14 poemas inéditos, que me mandou antes de partir para a eternidade, onde vagam os poetas. Passaram em minha mesa de bar Cordeiro Gomes, Aluísio da Cunha, Arthur Nery Marinho e Jeconias Araújo, bem como Isnard Lima, Poeta Galego, Saulo Mendes, Sílvio Leopoldo e Raimundevandro Salvador. Todos eles, grandes inteligências. Com rara exceção não publicaram livros.

Mas não é fácil publicar um livro. Ou se usa recurso próprio ou se vai atrás de patrocinadores, que normalmente preferem outras formas de divulgarem seus produtos. E é aí que a porca torce o rabo, porque quem deveria ter uma política editorial não tem e não terá, principalmente porque a poesia, já me disseram, não dá voto. E fica por isso mesmo?

(*) Jornal do dia, 2007.

Mais vida, menos grana – Crônica de Elton Tavares

Noite dessas, ao conversar com amigos e dizer que não guardo um vintém do que ganho com o meu suado trabalho, eles ficaram assombrados. Disseram que é loucura, que ‘issos’ e ‘aquilos’, especialmente sobre reservas econômicas para possíveis emergências. Eu disse que prefiro mais vida e menos grana.

Não, não é que eu não goste de dinheiro. Claro que gosto, mas tudo que ganho, no batalho e sempre honestamente, é repassado para custos operacionais e caseiros. O restante é gasto e muito bem gasto em vida. E não sobra nadica de nada para acumular.

Além da minha incorrigível falta de perspicácia financeira, nunca ganhei somas consideráveis com meus trampos, seja este site, na assessoria ou escritos (sim, vivo literalmente de palavras). Mas o que entrou no meu bolso, apesar de eu não conhecer essa tal de economia, jamais foi desperdiçado.

Eu bebo e não é pouco. Como da mesma forma. Gosto de viagens e dos momentos em que fiz um monte de merdas legais com os meus brothers. Isso tudo custa caro. Em nem todo o dinheiro do mundo poderia comprar aqueles dias de volta. Ou seja, mais vida, menos grana.

Quando não usei minha grana pra curtir a vida com amigos, ajudei pessoas. E essa é a melhor forma de torrar os trocados. Como disparou outro gordo louco no passado: “não quero dinheiro, eu só quero amar”. Grande Tim!

Falando em citações (amo usar frases de ídolos), uma vez o Belchior disse: “e no escritório em que eu trabalho e fico rico, quanto mais eu multiplico, diminui o meu amor“, na canção “Paralelas”. Boto fé nisso.

Algumas pessoas que conheci no passado, amigos e até familiares, após se estribarem, ficaram um tanto pavulagem demais e com suas vidas muito menos divertidas.

E isso me recorda o bom e velho Johnny Cash, que certa vez pontuou: “às vezes eu sou duas pessoas. Johnny é o legal. O dinheiro causa todos os problemas. Eles lutam”.

Ou os Paralamas do Sucesso, na canção “Busca a vida”: “…Ele ganhou dinheiro, ele assinou contratos, e comprou um terno e trocou o carro. E desaprendeu a caminhar no céu …e foi o princípio do fim!“.

Aos que desaprenderam o caminho, deixo a canção-poema : “Desejo que você ganhe dinheiro, pois é preciso viver também. E que você diga a ele pelo menos uma vez quem é mesmo o dono de quem“.

No meu caso, sigo dando mais valor em viver do que em poupar para um futuro incerto. Menos grana, mais vida, meus amigos.

É isso!

Elton Tavares

No MEC, a bagunça “imprecionante” impera em meio ao deboche

Essas lambanças do MEC em relação ao Enem/Sisu revelam, nua e cruamente, a bagunça que se tornou a gerência do setor de ensino do governo federal sob a era deste governo desastroso – e por que não malévolo – de Jair Bolsonaro.

Não bastasse a confusão na correção de provas do Enem, que resultou em decisão da Justiça Federal de São Paulo, suspendendo a divulgação da lista do Sisu, temos ainda outra doideira: o acesso de estudantes à dita relação que não poderia ser divulgada.

Enquanto isso, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, segue na mesma toada: o do deboche, do respeito, das agressões gratuitas e das performances ridiculamente imprecionantes.

Não à toa, a Comissão de Ética da Presidência da República aplicou a pena de advertência a Weintraub, por ter comparado os ex-presidente Lula e Dilma à cocaína encontrada em avião da FAB que integrava a comitiva de Bolsonaro durante viagem a Osaka, no Japão, no ano passado.

Em seu voto, acolhido à unanimidade pela Comissão, o relator, Erick Vidigal, diz que o ministro da Educação não pode ser “uma autoridade impulsiva, destemperada, que ofende quem quer que critique ou questione o seu trabalho, seja cidadão ou autoridade“.

Para Vidigal, Weintraub usa a “visibilidade que o cargo público lhe dá para ampliar a divisão existente atualmente na sociedade brasileira, incitar o ódio, a agressividade, a desarmonia, em total afronta ao que dispõe o preâmbulo da Constituição Federal e o CCAAF”.

Acrescenta Vidigal: “O Brasil precisa de união, de transparência, de solidariedade, enfim, precisa de uma liderança que o retire da quadra atual, caracterizada pelo ódio nas redes sociais, pela falta de educação generalizada, pelas fake news e pela utilização da máquina pública para a elaboração de dossiês mentirosos com o intuito de ofender a reputação das pessoas ou mesmo de prejudicá-las com demissões descabidas ou com a exposição pública.

Toma-te!

Ou então, repetindo Weintraub, imprecionante!

Fonte: Espaço Aberto

O velho, a loja e o Vasco – Por Marcelo Guido

A temporada futebolística de 2019 acabou para a maioria dos clubes e para o Vasco não foi diferente. Dentro das quatro linhas, um time limitado, um técnico vencedor e uma torcida que abraçou o time de forma poucas vezes vista no Brasil.

Longe de ter o que se comemorar de fato, mas passamos longe do desespero. O “pofexô” Luxemburgo cumpriu o que prometeu ao assumir o clube na zona de rebaixamento, entre os últimos na colocação da tabela.

Primeiro saímos da zona da confusão, rumamos ao meio da tabela e sim, conseguimos algo a mais no fim das contas. O Vasco não brigou para se manter na primeira divisão, o Vasco se manteve e não foi mais longe dentro do que podia, por erros seus mesmo. Pontos perdidos quando pareciam ganhos, erros grosseiros que mostraram a todos os que entendem de futebol, as limitações do elenco.

Bom, como já frisado, 2019 se foi para o Vasco; apenas a Taça Guanabara e o abraço secular da torcida que mais que dobrou o número de sócios torcedores para ser lembrado – esse sim motivo de grande orgulho. E 2020 nos parece ser mais real a partir de agora, nos últimos dias, horas; a probabilidade da entrada de um patrocinador controverso, mas com um cofre abarrotado de dinheiro fez com o que a torcida ficasse de orelha em pé. Se realmente a loja e seu dono aportariam em São Januário, como prováveis redentores do clube. Uma espécie de nova era.

Valores já são especulados, giram cifras astronômicas até onde sabemos. O Velho do Dinheiro, personagem que mais parece ter saído de um circo do que ser um empresário de respeito, olha para o Vasco e vê uma oportunidade de melhorar a própria imagem.

Oras, que outra torcida fez o que fez a do Vasco, no Brasil? Eu respondo: nenhuma. Qual outro clube de caráter popular, que sempre brigou pelos seus, que teve resposta histórica, que peitou mandatários e foi excluído de federação por apoiar seus atletas, que peitou gigante da comunicação? Respondo mais uma vez: nenhum.

Isso não passa despercebido aos olhos desse tipo de gente – que nada tem HAVAN, opa, haver com a história do Vasco. Sempre fomos mais povo que elite, mais clube do que time. O Vasco fez sua raiz popular e não é patrocínio que vai acabar com essa bela história. O futebol se fez negócio, e pra isso precisa de receita, não se monta elenco sem dinheiro.

A paixão nesse caso não alimenta. Somos escravos de cotas de TV que a cada ano são menores. Vimos o maior rival organizar as contas, atrair investidores e depois de 38 anos, ter um ano realmente perfeito. Vemos o time do Palmeiras montar cada vez mais um elenco maior e milionário a cada ano. E não tenha dúvidas: quem não fizer o mesmo, vai ficar para trás.

Não somos o “Massa Bruta”, que depois da Red Bull, será apenas uma bela lembrança da fenomenal camisa carijó. O Bragantino disputará a primeira divisão já com outro nome. Uma pena. Não sabemos ainda o que vai acontecer, mas como proprietários do clube, iremos ficar de olho. Não seremos o Corinthians a sorrir com aqueles dólares trazidos pelo gângster iraniano bancado por russos em 2005.

O Vasco, clube que se orgulha de sempre estar do lado certo da história, terá que escolher: ou adequa-se a uma nova realidade, ou continuará à margem dos futuros grandes feitos.

Infelizmente.

Marcelo Guido é vascaíno.

Novos Bares, Velhos Ares – Por Lara Utzig (@cantigadeninar)

As luzes de mercúrio dos postes da praça Zagury e do Trapiche me lembram semáforos-de-entrada-e-saída-de-veículos. A cor que representa Macapá em minhas lembranças mais longínquas é esse amarelo.

A rotatividade das opções de lazer também é dinâmica e constante. Na minha época (que já passou), o point era o Liverpool. O Francês também teve dias de glória. Euda. Underground. Nego. Jaime como plano B. 220. Hoje Vila e Treta. E antes disso tudo, havia o Círculo Militar.

De quinta a domingo os jovens mais jovens que eu saem em procissão pelas diferentes fachadas dos estabelecimentos que abrem, trocam de endereço, fecham, reabrem com o mesmo dono e outro nome, reabrem com o mesmo nome e outro dono. Táxi. Mototáxi. Uber. 99. YetGo. Carona. Busão para voltar às 22h. Transportes para abandonar o apolíneo e abraçar o dionisíaco.

Novos lugares. Antigos rostos. Arcaicas alcunhas. Imutáveis rótulos.

O maconheiro. A cheiradora de pó. O cara de 30 anos que não terminou nenhuma faculdade e é sustentado pelos pais. A esquerdista do PSTU que brigou com a galera do PSOL. O militante que não fala com a esquerdista do PSTU por ser do PSOL. A corrupta que desviou dinheiro quando estava no cargo. O estuprador-macho-escroto. O macho-escroto-que-não-é-estuprador-mas-é-abusivo. A fotógrafa que dá calote. O tarólogo. A mística da yoga. O músico ruim. A acadêmica de Direito que ganhou um HB20 ao passar no Enem (porque mereceu). O vocalista da banda que vai tocar e pega menores de idade.

Não sei quantas etiquetas existem no rodapé da minha vida, placas invisíveis que são lidas por terceiros. Certamente hashtag sapatão-escrota faz parte da lista.

Quanto tempo demora para apagar uma imagem? E desconstruí-la? E reconstruí-la?
Para destruí-la, basta uma noite, uma comanda, um vacilo. E ele jamais será perdoado.

Quantos bares abrirão e fecharão até aceitarmos que é possível ser mais do que um adjetivo?
Para cada DJ que sobe no palco, uma playlist de acusações.

Quantas músicas de karaokê serão cantadas para de fato as masculinidades tóxicas se desfazerem?
Para desintoxicar, só uma droga ainda não inventada em laboratório.

Quantas denúncias existirão para interromper a prática de gente-que-não-aprende?
Para parar, não parar de apontar nunca permite pensar (?)

Quantos copos se partirão pra se somar aos cacos de nossas honras?
Para cortar os dedos indicadores alheios, talvez amputar os próprios braços.

Entre um litrão e outro, o garçom vem me atender. Olho para ele e vagamente recordo:
Esse não é o doido que gostava de mijar nas garotas durante o sexo há uns sete anos? Será que ele ainda curte fazer isso até hoje com a esposa e as filhas?

Lara Utzig

Eduardo Bolsonaro não merece que ninguém o desculpe

Vocês, se quiserem, acreditem e desculpem.
Vocês, se quiserem, acreditem que Eduardo Bolsonaro, o ex-quase futuro embaixador do Brasil nos EUA que fez estágio fritando hambúrguer no Maine, não quis dizer o que disse, quando mencionou a possibilidade de volta do AI-5, o ato institucional que estuprou de vez a Constituição pela ditadura militar inaugurada em 1964.
Vocês, se quiserem, desculpem Eduardo Bolsonaro, que pediu desculpas após receber conselhos de papai Jair, esse monumento vivo à democracia, que já ensinou aos filhotes o valor dos princípios da liberdade e da democracia desde quando eles eram pequeninos.
Vocês, se quiserem, acreditem e desculpem.
Mas eu não acredito em Eduardo Bolsonaro.
E nem o desculpo.
Esse campeão da democracia jamais diria o que disse, se o que disse não lhe falasse fundo na alma, na mente e no coração.
Então, atire-se seu pedido de desculpas no lixo.
E ele que pague pelo que disse.
Inclusive, se for o caso, enfrentando um processo no Conselho de Ética por quebra de decoro.

Fonte: Espaço Aberto

Brasa X Bala- Texto de J. Arthur Bogéa (*) sobre o conto de Fernando Canto

A publicação do conto de Fernando Canto – Brasa Balançante – na edição deste jornal de n° 105 (dezembro/janeiro), coloca em evidência a revisão do passado recente: militares versus guerrilha e a acertiva de que História e Literatura têm um embrião comum. Marx, que está na moda ser considerado out, disse que aprendeu mais da História da França nos romances de Balzac, a quem dedica um estudo, do que nos livros de História do País.

As palavras – permita-se o jogo com Canto/Conto – da Narrativa estendem – se como uma corda bamba em que Autor/Atores se equilibram entre os dois lados dos combatentes: um determina o outro com a pergunta do “Alemão” – quem era realmente o inimigo(?)”. Cadeia para ele.

A pergunta do “Alemão” se estabelece a partir do título; Brasa Bala [(nç) ante]. Uma troca de palavras e o título se converte em Brasa ante Bala. Ambivalência. Para os dois lados “(n)aquela sacanagem de guerrilha” resta a maldição de Brecht: “Infeliz do país que precisa de heróis”.

Há um Narrador, na primeira pessoa que se interpõe entre o Autor e um Narratário (pluralizando) que se interpõe, por sua vez, entre o Narrador e o Leitor. O Narrador – “Eu era um soldado” (como muitos) e o Narratário (vocês jornalistas” (como os outros anteriores).

Há no texto ressonâncias de Guimarães Rosa. Ninguém passa imprudente pela leitura de Grande Sertão: Veredas. A teia e a trama do escritor se estendem ao Pós-Moderno. Bakhtin explica: em cada texto há ‘vozes’ de outros autores que ‘dialogam’.

Não há heróis entre os Atores, como a Narratologia prefere chamar os Personagens. Entre os guerrilheiros aprisionados há “uma loura – pálida” e “um barbudo feio pra caralho”. O Narrador se reflete no Almeida – “Alemão”, no Ibrahim – “Mão Benta”, Antunes e o “sargento” – a autoridade é anônima como o comando. São anti-heróis que desfilam e desafiam pela escritura de Canto.

O narrador sonha “em ser um herói (…) quem sabe ser promovido, chegar a sargento…” – aos olhos da Mãe, apenas citada, mas figura concreta, que o inconsciente do texto revela o desprezo pela mulher com a expressão “loura – pálida” e, uma figura abstrata: Pátria. Não é à toa que troca o fuzil (símbolo fálico) pela vassoura – varrer é uma atividade feminina no âmbito do privado que assume caráter masculino em público. Outra ambivalência. Sonha em varrer “O lixo da Pátria” – a Magna Mater.

Este Narrador só tem uma certeza sintetizada no verbo saber, para ele e o(s) Narratário(s): “Eu sei que vocês sabem de quase tudo que aconteceu lá no Araguaia” O “quase tudo” remete à pergunta do “Alemão”. É, portanto, o avesso do conhecer. Impreciso. O ‘contar’ do Narrador é sempre introduzido por uma pergunta: “vocês vêm me indagar sobre esse assunto?” ou “Entrevistar para quê?” – todas como um eco do “Quem vem lá?” a que “Mão Benta” não responde, por isso encontra a morte. O Narrador também não responde à história quando finaliza com um “Não sei, não sei, sei não”. Três negações, da campanha na selva à morte do heroísmo, morte civil quando deixa o exército e assume um emprego servil e, finalmente, morte da cidadania.

Vale ressaltar que Canto se recusa a regionalizar por regionalizar a ficção, por isso a expressão “à beça” e os termos “tauari” e “muru–muru” não soam artificiais, fazem parte do ‘dialeto’ do Narrador que conta a hi(e)stória, quem escreve é o Narratário. Alquimia da fala para a escrita.

Há ainda a destacar que a narrativa traz um tempo cronológico, “Vinte anos depois” e um tempo fantástico, “o estrondo no meio da noite repercutiu séculos na floresta”. Duas Vertentes que deságuam num escritor que atravessa a ‘maldição’ de ter sido adotado – O Bálsamo – no vestibular.

O autor é docente do Centro de Letras e Artes da UFPA e professor visitante da Rijksuniversiteit te Utrecht (Holanda).

(*) O professor José Arthur Bogéa faleceu em 2005.

Macapá, 13 a 19 de Janeiro de 1996 Folha do Amapá – 15 – VARIEDADES
Jornal Folha do Amapá