Poema de agora: REPAROS – @PedroStkls1

REPAROS

houve uma época da minha vida
em que acendia cigarro
brincava de ser maria fumaça
queimava solidão que todos babacas
que passavam por algum tipo de lugar meu deixavam.
no meio da cortina branca perdi uma parte minha
deixei mãe pai irmão e fui ser rebelde da minha causa ilusória

abria garrafa de cerveja com o dente
disfarçava o gosto amargo com halls melancia
só não sabia como disfarçar a partida de duas pessoas
que naquela época me traduziam alegrias
hoje apago bagana de cigarro com o pé

e faço meu fumo com fórmulas combinações e ervas de poesia
bandeira meireles barros quintana beber prado
guadalupe sant’anna nobre lucinda soeiro monteiro
e me tranco no quarto até bater a rima.

Pedro Stkls

Poema de agora: NADA ALÉM DO MAR – Netto Romano, inspirado em Lorena Queiroz

NADA ALÉM DO MAR (inspirado em Lorena Queiroz)

Entre areia e conchas eu escrevi sobre os lábios os meus versos

Eu respiro fundo com as confusões que o mundo me entrega

Dentro de uma garrafa de vidro eu escrevi um texto desapaixonado

Entre linhas e vírgulas que escondem minha aversão sobre a minha versão

Eu não preciso de mais nada agora, apenas do vento na rua

Eu não preciso de mais nada agora, além do amor das minha filhas

Eu só quero caminhar na areia, até o arpoador que me arremessou o arpão

Eu vou cantar meus pensamentos e me desfazer das amarras

Vou me deixar desmanchar no vento que seca minhas lágrimas

A minha alma tão bonita, hoje está renovada

Nos dias cinzas eu não quero mais nada

Nada além do mar, nada além de amar o mar

– Netto Romano

Apóstrofos e Parenteses – Texto de Luiz Jorge Ferreira para Fernando Canto

Texto de Luiz Jorge Ferreira para Fernando Canto

Fernando Canto comprou um Camelo.
E eu comprei um Boteco perto da Lagoa dos Índios.
Uma coisa curiosa…coloquei um chuveiro com um cano bem alto…mas bem alto mesmo fora do Boteco no quintal, e deixei lá…

Fim de tarde na Lagoa dos Índios – Macapá (AP) – Foto: @max_rene

Todo mundo que soube do Camelo na cidade, e da inauguração do Boteco, me perguntava…
– Mas para quê você comprou esse Boteco perto da Lagoa dos Índios…
…sim…comprei porque Camelos gostam de água e bebem muita água…
E retrucavam …mas o Camelo vai beber água no Boteco…com aquele imenso lago na Lagoa dos Índios ali perto?


Não !…quem vai beber água no Boteco é o Fernando Canto…água engarrafada…amarela…e gelada….
E o chuveiro alto…esse é para o Camelo tomar banho… pois Camelo toma banho!
Por fim eu vim embora de lá…não sei que fim levou o Camelo…
Eu soube depois que ele se habituou a ir para o Curiaú, cruzou com vários animais e o descendente que predominou foi a Bathicaxará…e todo mundo me pergunta …
E o que é uma  Bathicaxará ?
Eu não sei dizer o que é uma Bathicaxará…

Os poetas Fernando Canto e Luiz Jorge Ferreira, em algum lugar do passado.

Sei que uma Bathicaxará veio do Camelo que o Fernando Canto comprou, pelas proximidades do Boteco que eu comprei, influenciada pela beleza da Lagoa dos Índios, talvez debaixo daquele alto chuveiro que eu coloquei para ser confortável a altura do Camelo, e é uma Bathicaxará.
O local desapareceu sufocado pelo tempo, asfalto e amnésia de seus imprevisíveis frequentadores…
O nome do Boteco ficou em alguns textos que os amigos criaram…
Bathicaxará?
Não….Kamello!

Osasco – São Paulo – 15.10.2022
*Obs.  O amigo escritor e poeta Fernando Canto, aqui homenageado, não bebe!

Sem dar nome aos bois – Crônica de Ronaldo Rodrigues para um mundo melhor

Crônica de Ronaldo Rodrigues para um mundo melhor

Daqui a alguns anos, muitos e muitos anos, quando tudo for passado, eu estarei sentado em minha cadeira de balanço, fazendo palavras cruzadas ou estourando plástico-bolha e, de vez em quando, estendendo meu olhar pelos jardins do asilo numa tentativa de lembrar alguma coisa, alguém, um rosto, uma palavra.

Há tempos que esqueci o nome de algumas pessoas (que bom!), mas lembro de certas coisas de suas personalidades. Não me importo com o que houve com elas, é só uma curiosidade que bate de vez em quando: onde estarão essas pessoas? O que aconteceu com suas vidas imbecis?

• “Inútil! A gente somos inútil!”, cantava aquele rebelde sem causa nos anos 1980 para, nos anos 2000, desafinar feio e mostrar que ele estava certo, se revelando mesmo um inútil. Realmente um fato ultrajante! Com ele, vários ícones de sua geração também reforçaram o refrão da decadência, sem a mínima elegância.

• Fazia belas ultrapassagens aquele piloto de Fórmula 1, conhecido também pelo seu humor azedo e sua voz um tanto fora dos padrões sonoros estéticos. Ele derrapou na reta final de sua vida e serviu de motorista a um sujeito que entrou de carona na direção do país, graças a milhares de desorientados que se deixaram guiar para o abismo de seus pensamentos e sentimentos anti-humanidade.

• E aquele jogador de futebol mimado que arrasava dentro de campo (quando não estava deitado na grama) e era um completo perna de pau fora das quatro linhas? Driblando possíveis condenações por sonegação de impostos, entrou no time do cara que se achava o dono da bola. Fora de campo, o nosso craque marcou inúmeros gols contra e espero que não tenha se afogado nos seus milhões de dólares. Mas o futebol é assim: salvando algumas honrosas exceções, por mais craque que o sujeito seja com a pelota, costuma ser ruim da cabeça. O próprio rei indiscutível desse esporte se revelava um tremendo pereba sempre que o assunto escapava de seus habilidosos pés.

• E aquele jogador de basquete, o maior de todos, que quando arremessava suas opiniões via-se que suas palavras não tinham o mesmo brilho que sua mão santa tinha em quadra.

• E o sujeito que quebrou a placa da rua em reação ao nome que estava escrito lá? Será que ele conseguiu, pelo menos, se tornar nome de um beco sem saída?

• E o assassino da atriz da novela das oito? Sei que ele se transformou em pastor evangélico e ergueu um altar para seu ídolo-mor.

• E por falar em pastor, que terá acontecido com todos aqueles impastores (pastores impostores), ladrões da fé alheia? Será que esses vendilhões do templo, detentores de concessões televisivas e internéticas, se entupiram de dinheiro e estouraram, desta vez de verdade, não na audiência de seus seguidores?

• E os tantos humoristas desengraçados, grosseiros, que perderam o ritmo, o timing, e chafurdaram em piadas de baixíssimo senso de humanidade?

• E os sertanejos, que já haviam conspurcado o verdadeiro sentido da música caipira, autêntica, de raiz? O que terá acontecido com esses glorificadores do agronegócio?

• E os meus ex-amigos artistas, que empunhavam lápis, tinta e papel e se viram seduzidos a fazer o sinal de arminha na mão? Será que foram devorados por sua mediocridade?

• E aquela gente que nunca havia se manifestado na vida, nem contra nem a favor de coisa alguma, que não hesitou em vestir a camisa verde e amarela de um patriotismo torto? E os que enveredaram por um anticristianismo, de exclusão e impiedade?

• E os produtores e disparadores de fake news? Onde estarão espalhando suas mentiras?

Será que alguém aí, que estiver lendo estas linhas, pode arriscar um palpite? Melhor não. Deixa esses merdas pra lá. Prefiro pensar que o tempo passou pra todos nós (que estivemos do outro lado) como um bálsamo e nos curou de todas essas doenças. Eu vou parar por aqui porque já estou sentindo asco de tentar lembrar dessa gente escrota (era gente mesmo aquilo?). E espero sinceramente, tomando emprestado um pequeno trecho da carta do chefe Seattle, que essa galera toda tenha sido sufocada pelos próprios dejetos.

Poema de agora: Inaudito – Pat Andrade

Inaudito

uma lua no céu
discreta e cínica sorri
me sussurra um poema
impossível de ouvir

as placas passam devagar
a mente dispara
voa e ultrapassa
os limites de velocidade
para alcançar o além

rompe a barreira do som
perfura a atmosfera
desafia a gravidade
e incendeia no espaço

não ouve o poema

Pat Andrade

Aos loucos, pirados pelo poder – (Crônica de Elton Tavares – do livro “Crônicas De Rocha – Sobre Bênçãos e Canalhices Diárias”)

Ilustração de Ronaldo Rony

Crônica de Elton Tavares

Queria que esses loucos por poder fossem tomados por lucidez e bom humor. Que eles respeitassem nossas individualidades, fraquezas, escolhas e habilidades. Gostaria que estes canalhas avaliassem o profissional, a pessoa, o amigo, sem o sagaz desejo de domínio absoluto do ser e sem a mão pesada da tirania imbecil.

Queria que estes doidos por dinheiro nos deixassem escolher, questionar, discernir, pensar livremente. Queria que os insanos por status nos desse o direito de sermos sinceros, de vivermos com clareza, de acordo com nossas escolhas, sem ameaças ou tramas de desconstrução de nossas imagens.

Ficaria feliz com um pouco de reconhecimento pelo que foi feito, pelo que aconteceu, pelos bons e ilusórios tempos de brodagem. Também seria grato se os alucinados se tocassem que não possuem superpoderes, muito menos competência para “queimar” quem não atende seus desejos.

Queria que fossem menos incoerentes, estúpidos, insensatos e imorais. Uma pena que loucos maus conduzam cegos, entre eles, bons cegos.

Por fim, queria mesmo que esses malucos monsenhores boçais e seus vassalos, envenenados pelo poder, parassem de, a esta altura do campeonato, tentar dar um migué (fraco) para cima de quem os conhece bem. Chega, insanos, de tentar rezar a missa em latim de trás pra frente.

Afinal, ninguém é totalmente mau ou plenamente do bem, mas injustiça e perseguição gratuita é loucura. E como é! Ah, como eu queria que esses loucos fossem menos pirados por poder.

Elton Tavares

*Texto do livro “Crônicas De Rocha – Sobre Bênçãos e Canalhices Diárias”, de minha autoria, lançado em 2020.

Playlist – Crônica de Lorena Queiroz – @LorenaadvLorena

Crônica de Lorena Queiroz

Dia desses eu estava bebendo sozinha em casa. Sim, eu adoro fazer isso. Gosto muito da minha companhia. Posso passar um dia bebendo sozinha, dançar, cantar e rir como se estivesse em uma rave. O que a gente precisa nessa vida é de um alucinógeno e música. Nietzsche disse certa vez que só acreditaria em um Deus que soubesse dançar. Eu também, bigode. Eu também.

Acredito que por isso, nestes momentos de solitude, muito diferente de solidão, a música é tão importante como fiel companheira. E dentro dessa sintonia entre álcool e música, tem uma trepada prazerosa que acaba parindo a literatura. Acho que é por isso que eu gosto tanto de beber e ouvir música.

Estava ouvindo 1979 do Smashing Pumpkins  e um amigo recente me disse que sabia que eu era gente boa quando prestou atenção nas músicas que eu escutava. No filme Mesmo se nada der certo, a personagem da Keira Knightley diz que você pode descobrir tudo sobre uma pessoa só olhando a sua playlist de músicas. Acho que de certa forma a personagem acertou, ao menos comigo é assim, mas acredito que esse reconhecimento só é possível à pessoas que possuem certa sensibilidade, pois nem todo mundo dá a mesma importância às coisas. Talvez por minha trilha sonora estar tão conectada ao que eu sou, é que eu dou.  Eu canto Vaca profana por um trecho que me define: “Respeito muito minhas lágrimas, mas ainda mais minhas risadas”. Gilberto Gil me ajuda a limpar a casa andando com fé, que a fé não costuma falhar. Eu lembro de amigos dançando com uma touceira de mato na bunda ao som de Morrissey. Eu danço com Ian Curtis até hoje. Repenso a vida com Krishna Das. Vibro com meu parceiro da vida, Belchior. Brindo com Marisa Monte.

Vejo minha filha dançar com Tim. Revisito toda uma vida com Chico, Vinicius e Tom. E todas as memórias de inícios retornam com Beto Guedes, Milton Nascimento e Lo Borges. Lembrar de todas as vezes que fui a Salinas com meu pai ouvindo Noite ilustrada. Uma colcha de retalhos cheia de sons e poemas.

A maioria dos escritores que conheço estão diretamente ligados a essa junção; a empolgação que Cortázar tinha pelo Jazz e que explode como tomadas em suas obras. Nosso velho safado completamente embriagado e genial. E o nosso amigo Fernando Canto? Esse é literalmente um megazord de música, birita e literatura.

Então é isso, leitor. Abra sua garrafa, ou qualquer alucinógeno da sua preferência, ou os dois, e escute a sua canção. Não sei o que essa música vai te dizer e também não é da minha conta. Eu nem sei o que eu queria escrever aqui. É só mais um dia em que eu estou bebendo e escutando a minha playlist.

*Lorena Queiroz é advogada, amante de literatura, devoradora compulsiva de livros e crítica literária oficial deste site, além disso é escritora, contista e cronista. E, ainda, mãe de duas meninas lindas, prima/irmã amada deste editor.

Poema de agora: “Angu” – Ricardo Iraguany

 


“Angu”

Não é só vestir verde e amarelo pra ser brasileiro
Sem sentir o som e o swing
Dos nossos pandeiros
Sem saber da nossa história do índio e do negro
Do cafuso,do mulato, cabano , caboclo

Não é só vestir verde e amarelo pra ser brasileiro
E ficar montado no dim dim sonhando com os states
Sem levantar uma fagulha só no preconceito
De quem trabalha e vem da roça de quem vem do gueto

Pra ser brasileiro tem ouvir o canto do uirapuru
Tem que saber que a frigideira frita ovo
Mas também dá som
Tem que saber do nosso enredo
E comer do nosso Angu.

Ricardo Iraguany

Poema de agora: Quando praguejar é uma prece! – Luiz Jorge Ferreira

Quando praguejar é uma prece!

Meça seu passos
Calcule que se fosse ruflar de asas terias alcançado cume cobertos de gelos eternos.
E trocando passos não saístes nem longe do teu bairro…e a sensação de estar só começa a te alcançar…e o incômodo de estares expostos ao perigo que ronda quem se perde não se mede por pânico, nem suor abundante nas mãos.

Imagina as crianças órfãs das guerras expostas a todo o tipo de medo, surpresas a todo o tipo de modos, estranhas a todo tipo de gente.
Sem sono, sem sonhos, com sede, com fome, sob as garras dos fantasmas homens que se divertem se as matam.

Meça seu passos, meça suas tardes, meça suas pegadas na areia, suas migalhas sob a mesa, suas estranhas vontades repletas de enredos, erga seus dedos em direção ao Cruzeiro do Sul, estranhamente ao Norte.

Eu me abrigo em minhas ideias como um canguru no Marsúpio de sua mãe.
Meço meus passos desde os primeiros passos de Adão…
Em vão, que não chego.
Cuspirei um Oceano sobre vários.
Ofenderia os Orvalhos se os molhasse com ele.
Ofenderia Deus se pedisse que os protegesse ..
Em paz com as crianças vitimas das guerras que atiram pedras quando passam os vassalos…
Eu enormemente ínfimo…atiro pragas !

Luiz Jorge Ferreira

Escritor amapaense lança obra com poesias que abordam o seu cotidiano amazônico

Neste sábado, 1º de outubro, o escritor amapaense Tiago Quingosta lança seu primeiro livro solo e segunda obra da Trilogia das Águas, o livro Aluvional. O evento está marcado para acontecer às 16 horas no Mercado Central de Macapá. Na obra são abordadas temáticas relacionadas às experiências de vida do autor na Amazônia, cuja voz é a manifestação identitária de um homem do norte.

“Não é o primeiro trabalho lançado, mas é a primeira vez que me dedico a um trabalho solo e que leva a cultura e mostra a minha vivência enquanto amazônida. Então, poder trazer isso é gratificante não só como artista, mas como filho desta terra”, detalha Tiago.

Durante seis capítulos e 60 poemas – entre os quais está Imersio, um trabalho audiovisual, disponível no Youtube – percorre o seu amadurecimento enquanto escritor e artista, apresentando versos de um homem forte e condizente com suas dores e realidades.

Aluvional traz a poesia amazônica na sua ambientação e utilização das palavras para descrever o que sente, para fazer o leitor mergulhar nas águas do maior rio em volume de água do mundo, o rio Amazonas, aborda uma jornada poética em meio à maior floresta tropical do mundo.

Serviço:

Lançamento do livro Aluvional
Data: 1º de outubro de 2022
Hora: 16 horas
Local: Mercado Central

Lucas Costa – Jornalista
Fone: 96 98115-4419
Email: [email protected]
Assessoria de comunicação

Poesia não dá voto (*) – Crônica atemporal de Fernando Canto

Crônica de Fernando Canto

Poucas vezes vi uma casa de shows lotada para ouvir poetas declamando seus textos como em um dia 25 passado, no Teatro das Bacabeiras. Por obra e graça de pessoas iluminadas como Carla Nobre e seu grupo, do movimento poético Abeporá das Palavras, aproximadamente vinte poetas mostraram suas poesias numa noite não muito longa, onde pouquíssimos espectadores saíram antes da hora. Ora, ouvir poesia depende de gostar muito. E tanta era a diversidade de estilo que só mesmo quem entende e gosta ficou até o final. Um final interessante, diga-se, pois contou com a participação especial do cantor e poeta guianense Moise Culture, que cantou um reggae, acompanhado pelos presentes. No mais a brilhante participação de Eliakim Rufino, poeta roraimense investido de mestre de cerimônia, fez do evento um espetáculo valorizado, onde os poetas convidados se tornaram estrelas como qualquer show-man num palco iluminado.

Talvez seja hora de fazer um balanço sobre a poesia amapaense. Por incrível que pareça raros são os livros editados anualmente em Macapá nessa área. Não obstante existir tantos poetas, conhecidos ou não, a ausência de divulgação da produção poética é patente. Não vi até hoje nenhum Governo do Estado, enquanto “incentivador da cultura”, promover e incentivar absolutamente nada para que esse segmento se tornasse até mesmo mais popular. Não fossem eventos como esse, os trabalhos escolares, as feiras e exposições periódicas dos colégios, é possível que nunca viéssemos a ter alguma produção nova, descobertas de talentos ou mesmo reafirmação de talentos já consagrados em nossa terra.

Se o trato que os setores competentes dessem à poesia (e à literatura de modo geral) como dão à música e ao teatro a coisa fatalmente mudaria de figuração. Nunca vi, reitero, nunca vi mesmo alguma instituição cultural oficial se preocupar com esse sonho louco de nefelibatas e doidivanas. Há quem diga que é preferível que esses malucos pratiquem suas salabórdias inúteis pelos cantos do que virem aborrecer os secretários e presidentes com suas artes não-recomendáveis para menores e pedir apoio para encherem a cara de cana. É, tem gente que ainda acha que a poesia é uma arte marginal, feita por marginais e viciados.

Felizmente convivi com os mais importantes poetas do Amapá. Até os mais velhos eu conheci pessoalmente. Destes, o único sobrevivente é o poeta concretista (nas décadas de 50 e 60) Ivo Torres, habitante da cidade do Rio de Janeiro e ainda na ativa com seus 77 anos. Tão honrado e sensível como ele foram os mestres Alcy Araújo, o prefaciador do meu primeiro livro, e Álvaro da Cunha, de quem guardo 14 poemas inéditos, que me mandou antes de partir para a eternidade, onde vagam os poetas. Passaram em minha mesa de bar Cordeiro Gomes, Aluísio da Cunha, Arthur Nery Marinho e Jeconias Araújo, bem como Isnard Lima, Poeta Galego, Saulo Mendes, Sílvio Leopoldo e Raimundo Evandro Salvador. Todos eles, grandes inteligências. Com rara exceção não publicaram livros.

Mas não é fácil publicar um livro. Ou se usa recurso próprio ou se vai atrás de patrocinadores, que normalmente preferem outras formas de divulgarem seus produtos. E é aí que a porca torce o rabo, porque quem deveria ter uma política editorial não tem e não terá, principalmente porque a poesia, já me disseram, não dá voto. E fica por isso mesmo?

(*) Publicado no Jornal do Dia, em 2007.

A entressafra criativa – Crônica de Elton Tavares – Do livro “Papos de Rocha e outras crônicas no meio do mundo”

Crônica de Elton Tavares

De tempos em tempos, não consigo filosofar, mesmo que de forma barata, sobre a vida. Antes redigia um texto por dia com tanta facilidade. É, nem escrevo mais tanto sobre boemia, um de meus assuntos prediletos. Quem dera ter o dom de poetizar ou redigir uma crônica sobre uma invenção qualquer.

Essas insônias solitárias, na companhia de livros, fotos, papos virtuais e a madrugada com a trilha sonora recheada de The Cure promovem uma mistura de sensações e doideiras. Sobre isso, não basta neste momento para um bom texto.

Aí volto a tentar escrever algo legal, seja sobre o trabalho, este novo blog e todas as possibilidades…

Quem sabe sobre amigos.

Nada.

Me faltam ideias.

Normal, é a “entressafra criativa”. Talvez sobre o dia a dia de um assessor de comunicação-jornalista-editor? Nada…quanta tolice!

Quando ocorre, substituo o conteúdo feito de invenção por posts informativos. Claro que com referências e assuntos que acho que são relevantes.

O jeito é canalizar a energia para leitura, afinal os livros sempre fertilizam as ideias e aquecem a paixão pela escrita sobre tudo, até os sonhos. É, vou ler um pouco e tentar dormir. Tomara que amanhã eu vá à forra, viva mais, experimente mais dessa experiência que é existir, e assim, a entressafra criativa vá embora.

Por enquanto, vamos aos sonhos – outra maneira de encontrar com o lúdico de viver. É isso!

*Do livro “Papos de Rocha e outras crônicas no meio do mundo”, de minha autoria, lançado em novembro de 2021.

Poema de agora: sobre cansaço e violência – Pat Andrade

sobre cansaço e violência

exaustão e cansaço.
cansaço de sentir.
cansaço de existir.

uma existência que trava
uma luta diária pelo belo,
pelo amor, pelo fraterno.
uma luta desleal.
é tanto o sentimento.

do outro lado, a sujeira, o descaso,
o egoísmo, a maldade
se dão as mãos ásperas
e se armam de falsa moral
e hipocrisia para o combate.
é vil o sentimento.

longas batalhas ora em silêncio,
ora em total estardalhaço.
tormento de alma e espírito
é muito o sentimento.

e os sorrisos vão desistindo de ser.
e as mãos vão se recolhendo,
negando gestos.
os olhares tristes, molhados,
desviam seu trajeto.
é triste o sentimento.

a boca se fecha.
os braços se fecham.
meus olhos baços também se fecham.
viver é violento.

Pat Andrade

Poema de agora: Esboço – Luiz Jorge Ferreira

Esboço

Era um tempo mágico em que se acreditava em sonhos.
O amanhã nasce
Na verdade eu o retiro do bolso sob as luzes do candeeiro amarelado

Que desenha com suas sombras encharcadas de fuligem
Quadrilateros sucessivos como faces risonhas
Ou ensaios de estranhos choros calados.

Tudo nos conduz a um tempo de pisadas fortes no corredor
O tempo acorda o menino que a vida não acordou
Sob a réstia de luz que se projeta preguiçosamente entre anos deixados para trás, o pai olha absorto que seus projetos expostos se descubram sonolentos.
Enquanto a vida la fora rebelde como um bravio potro, galopa pelas esquinas, sem se ater aos Semáforos, pois voar não é sua sina, mas preferia que fosse…

Luiz Jorge Ferreira