Poema de agora: IN(en)FORMANDO – Ori Fonseca

IN(en)FORMANDO

Alguns amigos meus não gostam de soneto,
Reclamam de que a forma os deixa bem mofinos.
Então, deixem-me agora, em mais alexandrinos,
Dizer-lhes que universos cabem num quarteto.

Se amam verso branco, eu amo verso preto.
A rima está no gueto e fala dos meninos,
No rap, no hip hop e causos nordestinos.
Então, segura a mão, que agora é “cuns terceto”.

Cantando o amor, a chuva, o Golpe, o desemprego,
Poemas são buracos negros, e eu sou só
Um preto corpo estranho a desfazer-me em pó.

Contudo, se o soneto é-te um desassossego,
O bicho vai pegar de novo, viu, meu nego?
Vai ter balada, trova, ode, haikai, rondó!

Ori Fonseca

Poema de agora: PORQUE TE AMO – Fernando Canto

PORQUE TE AMO

O fixo amor não morre
Enquanto ebulível soro

Que alimenta o avesso
Da mulher que me acompanha

Eu te amo por princípio
Por luz, escola e ofício

Em geometria de trapézios
E a corda bamba do circo

Eu te amo adstringente
Por ser tenaz este escopo

Eu te amo como amo
O vento que desvanece

Quando um segredo nasce
Na hora de todo início.

Fernando Canto

Bruno Muniz lança e-book “Cem Versos Putos Sobre Mim”

O escritor e autor do livro cult “Cem Versos Putos Sobre Mim“, Bruno Muniz, lançou recentemente a versão digital da obra. O livro físico, publicado em 2016, já atingiu a tiragem de 500 exemplares. Clique aqui para adquirir para adquirir o e-book.

Prefaciado por Gabriel Nascente, vencedor do Prêmio da Academia Brasileira de Letras de Poesia, em 2014, o e-book conta com poemas musicados pelos cantores amapaenses Osmar Júnior e Zé Miguel.

O próximo livro “Depois vá ver o mar”, está em fase de revisão e será lançado em breve .”Comecei a me interessar por literatura aos 11 anos e depois que comecei a escrever não parei mais”, conta. Além de escritor, o artista goiano, que mora em Macapá há cerca de três anos, é compositor, cantor e toca violão.

Integrante do grupo musical “Beatos Cabanos”, formado também pelo poeta Marven Junius e pelo cantor Osmar Júnior, uma de suas composições “Carpideira”, composta em parceria com Osmar, foi classificada na 16ª edição da mostra de música SescCanta Amapá, ocorrida no final de 2019.

Foto: Reprodução/Instagram.

Selecionado pela Antologia de Poesia Brasileira Contemporânea, da Editora Portuguesa Chiado, com o poema “Além-mar”, Bruno também faz parte de uma Coletânea de Contos e Crônicas, com o texto “Melhores Amigas” e foi selecionado para participar de um edital de uma editora goiana para novos autores goianos.

Em 2016 e 2019, o escritor foi agraciado com o diploma de Destaque Cultural pelo governo do Amapá por serviços prestados à literatura. Seus dois clipes, “Soneto da ilusão” e “Pra te ver passar“, já foram curtidos e visualizados nas plataformas musicais por quase 100 mil pessoas.

Suas próximas apresentações acontecerão ainda este mês, nos projetos Macapá Verão e Circula Amapá.

Fonte: Portal Égua, mano!

Poema de agora: SER TÃO… – Ori Fonseca

O sertão é do tamanho do mundo.
Sertão é dentro da gente.
O sertão é sem lugar.
O sertão não tem janelas, nem portas.
O sertão é uma espera enorme.
[Guimarães Rosa]

Ilustração: Fotografia de Hans von Manteuffel.

SER TÃO…

O sol resseca a tez da terra nordestina,
A boca sem saliva entoa um canto triste,
E pede em vão a Deus, que a tudo só assiste:
Morrer o gado, o grão de sede e de rapina,
E ao homem ver morrer de morte severina,
Na dor que se acha em casa estando no sertão.
A dor que é mais que dor no olhar do sertanejo,
Que açoita, invade, entranha e habita de latejo
Dos pés em carne viva ao breu do coração,
Em cada vez que pede algum trabalho ou pão.

O calo rasga a pele, a fome rasga o brio,
A lágrima é calada, a voz, estrangulada.
O homem não controla a dor desesperada,
A mesma dor pungente que seu pai sentiu
No mesmo quarto escuro à margem do Brasil.
Vagando sem destino, as almas do sertão,
Não têm parada certa sem que seja a cova,
Morada certa e sempre a velha casa nova,
Reforma agrária eterna, naco de seu chão,
Lugar do qual jamais há de estender a mão.

A fé, que é só o que resta quando o nada é tudo,
Mantém um fio de vida num fio de esperança
Em São José, Padim, na Virgem da abastança,
Em terço, andor, novena, santo mouco e mudo,
A fé que cobre a todos com seu falso escudo
É pão de barro seco, esmola pro sertão.
Não muda a sina injusta, a cena de tristeza
Que arrasta como cobra a gente em correnteza,
De mãos aos céus clamando a vida em oração.
E o verso diz “lá vai passando a procissão”!

A seca é só pretexto para o mal da usura.
Tiranos dormem calmo ao som de tanto choro,
Gemidos são lançados longe em triste coro,
Contudo, não alcança o ouvido da criatura
Feroz que come e bebe às custas da amargura,
Roendo cada ossada errante no sertão.
Poder que faz da morte a sorte de sua cria,
Que sempre, sempre, sempre, SEMPRE! Noite e dia,
Devora tudo e todos – pai, avô, irmão -,
Que “pega, mata e come” e ri da humilhação.

Então, que leva a alguém viver nesse pedaço
De chão sofrido, seco e tão aperreado?
Cultura, luta e a voz de um povo acostumado
A ser valente e artista e não negar o braço
No toque, se é zabumba; e tiro, se é cangaço.
A guerra é festa, e a festa é guerra no sertão.
Pois se há xaxado, xote e a voz do cantador,
Também se há de haver a mão do lutador:
Sanfona atada ao peito – voz de Gonzagão;
Fuzil ao peito atado – mão de Lampião.

“Palavras, ai, palavras, que potência a vossa!”
Cravada ao chão rachado e fértil do Nordeste:
Oxente, Exu, açude, Orós, cabra da peste,
Forró, buchada, fé, burrego, assum, carroça,
Palavras, só palavras, nada em que se possa
Dizer que não é sina o inferno do sertão.
O sol é só palavra e luz de força e vida,
Ganância, é fome, é morte, dor, terra partida.
Não pode haver justiça enquanto houver razão
Em só dizer “sim… sim” e ouvir só “NÃO e NÃO”!

Ori Fonseca

Poema de agora: Vela ao vento do Equador – Jaci Rocha

Vela ao vento do Equador

“…And it seems to me you lived your life
Like a candle in the wind
Never knowing who to cling to
When the rain set in …”

Como uma vela ao vento*,
a emoção vive de sobreviver em si
entre a vontade do instante
e o dom inexorável de seguir…

Ainda ontem, abri um antigo diário
ri de um pedaço de uma das muitas jacis do passado
e feito uma boa amiga, guardei seus segredos comigo
envergonhada pelo ato obsceno de ler o que já não me pertencia

é, foi nostalgia…

Como uma vela ao vento,
vivo de tentar ser luz e tropeçar em meus assombros
Regar plantas e aparar os danos
Derreter em sonhos, ícaro ao sol do equador…

E para fingir que sei onde estou
ligo o localizador.
Assim, a razão, tola, acredita que sabe onde está
– …vela ao ar em dia de preamar… –

Mas será que alguém sabe mais do que isso?
Será que alguém tem mesmo alguma certeza?
Meteorologistas dizem que sabem da natureza
E há quem saiba explicar a rota do mundo

Mas bastam 60 segundos de um forte sopro
Para o coração desnortear
E a vela acesa da emoção mudar a direção
de sentir o vento soprar…

Jaci Rocha

Poema de agora: FUGAS – Pat Andrade

FUGAS

às vezes
saio de mim em segredo
e ando a esmo

são fugas estelares
momentos fugazes
em noites infinitas

procuro luas
impossíveis de achar

reviro o pó das estrelas
uso a luz dos cometas
danço com selenitas
e me perco entre os planetas

quando consigo voltar
trago o rastro da lua minguante
e o esplendor da lua cheia

trago promessas esquecidas
trago sonhos distantes
trago mil belezas não vistas

trago auroras douradas
e galáxias inventadas

PAT ANDRADE

Poesia que não se esgota (Por Fernando Canto) – @fernando__canto

A poesia não se esgota no pensamento porque ela é o esforço da linguagem para fazer um mundo mais doce, mais puro em sua essência;

A poesia procura tocar o inacessível e conhecer o incognoscível na medida em que articula e conecta palavras e significados;

Cada imagem representada, projetada pelo sonho, pela imaginação ou pela realidade, é um símbolo que marca o que sabemos da vida e seus desdobramentos, às vezes fugidios.

Mas nem sempre é o poeta o autor dessa representação, pois tudo o que surge tem base social e comunitária, depende da vivência de realidade de quem propõe a linguagem e a criação poética.

Quando isso ocorre estamos diante da autenticidade do texto poético. E todos somos poetas, embora nem sempre saibamos disso. E ainda que nem tentemos sê-lo.

Hoje é o Dia Estadual da Poesia (minha homenagem aos poetas do Amapá!)

Hoje é o Dia Estadual da Poesia. Admiro os poetas, sejam cultos, que usam refinados recursos de linguagem ou ignorantes, que versam sem precisar de muita escolaridade. Eles movimentam o pensamento e tocam corações. Não é à toa que as pessoas têm sido tocadas pela poesia há séculos. E nem interessa se o escrito fala de sensatez ou loucura. Tanto faz. O que importa é a criatividade, a arte de imprimir emoções em textos ou declamações.

Alexandre Vaz Tavares,

De acordo com a jornalista e poeta Alcinéa Cavalcante, o dia 8 de agosto é o Dia Estadual da Poesia, instituído pela Lei nº 580, de 21/06/2000. A escolha do oitavo dia do mês oito se deu em homenagem ao poeta, médico, professor e ex-prefeito de Macapá Alexandre Vaz Tavares, nascido na capital amapaense nessa data, em 1858. Consta que ele foi o primeiro poeta a escrever poemas sobre Macapá. Sua poesia “Macapá” (praticamente desconhecida das novas gerações) foi publicada pela primeira vez em agosto de 1889, na Revista de Educação e Ensino do Pará. Vaz Tavares morreu em abril de 1926, aos 67 anos.

A palavra “poesia” tem origem grega e significa “criação”. É definida como a arte de escrever em versos, com o poder de modificar a realidade, segundo a percepção do artista.

O poeta autor/trovador escreve textos do gênero que compõe uma das sete artes tradicionais, a Poesia. A inspiração, sensibilidade e criatividade deste tipo de artista retrata qualquer situação e a interpretação depende da imaginação dele próprio, assim como do leitor.

O Amapá precisa preservar, reconhecer e homenagear seus grandes nomes em todas as áreas de atuação. Como sou fã de escritores, compositores, músicos, poetas e artistas em geral, faço isso, por aqui. Pois a gente precisa aplaudir e elogiar sempre. Não tenho o nobre dom de poetizar, sou plateia. Mas apesar de não existir poesia em mim, uso a tal “licença poética”, para discorrer sobre meus devaneios e pontos de vista.

Hoje minhas homenagens são para os poetas amapaenses (ou que versam sobre nossa terra) que são meus amigos (somente os amigos mesmo). São eles: Fernando Canto e Alcinéa Cavalcante (para mim, os dois maiores daqui), Obdias Araújo, Aline Monteiro, Jaci Rocha, Maria Ester, Arílson Souza, Arílson Freires, Bruno Muniz, Júlio Miragaia, Paulo Tarso Barros, Thiago Soeiro, Pedro Stkls, Lara Utzig, Manoel Fabrício, Luiz Jorge Ferreira, Marven Junius Franklin, Flávio Cavalcante, Carla Nobre, Mary Paes, Andreza Gil, Manoel Fabrício, Leacide Moura, Mauro Guilherme, Annie de Carvalho, Ivan Daniel, Patrícia Pereira, Mayara La-Rocque, Bernadeth Farias, Patrícia Andrade (a poeta que mais colabora com este site), Ronaldo Rodrigues, Andreia Lopes, Kassia Modesto, Jô Araújo, Sabrina Zahara, Weverton Reis, Tãgaha Luz (In Memoriam),  Kiara Guedes, Mary Rocha e Carlos Nilson Costa.  Além de todos os poetas compositores brothers, que transformam poesia em música, Joãozinho Gomes, Val Milhomem, Osmar Júnior, Zé Miguel e Naldo Maranhão. Muito obrigado!

Escritores e poetas Fernando Canto e Alcinéa Cavalcante. Os meus muito queridos amigos e maiores poetas do Amapá. Foto: Flávio Cavalcante.

Também saúdo todos os movimentos que fazem Poesia no Amapá, que realizam encontros em praças, bares, residências, etc. Enfim, saraus para todos os gostos. Portanto, meus parabéns aos poetas, artistas inventivos que fascinam o público que aprecia a nobre arte poética.

Parabéns aos poetas do Amapá. Principalmente aos meus poetas preferidos!

Elton Tavares

Poema de agora: Homenagem – Manoel Santana Câmara (ao amigo João Camara)

Homenagem (ao amigo João Camara)

Eu amo as flores caídas neste quintal esquecido
nenhuma vassoura passa aqui há muitos anos
apenas um gato cuida
de sua morada nesse telhado onde os ratos crescem como um dia cresceu minha esperança
mas hoje na entrada da casa, baratas passeiam e a solidão mora junto com meus antigos sonhos


mas eu passo a passos lentos e tento entrar
não preciso de chave a porta foi comida pelo abandono
e ali presente apenas as minhas lembranças
sou passado e aqui onde morei
Morro de saudade.

Manoel Santana Câmara

*Contribuição do poeta Luiz Jorge Ferreira

Poema de agora: A colecionadora – Jaci Rocha

A colecionadora

Livros ao chão
E a doce ilusão
De que sei algo!
ah! De que sei algo – e me delongo na ilusória distração…

Mas, de súbito, se achega uma borboleta
Asas e cor sob o ar,
Flor delicada que, ao vento, quis morar…
Ah! por que, carbono, a flor borboleta voa?

A já não me cabem noções de aerodinâmica!
Por que também não nasci com asas?
Se tão feliz, dançaria com as borboletas amarelas
Que passeiam, em Setembro, pela estrada…

Por que, carbono, terra é marrom
E essa pele que me reveste inteira,
Ou este rosto, ou esse afã
Por que aqui, neste momento
E não noutro, em 1500?

Nada que a religião não sossegue
E a filosofia não dite
Mas, por que enfim, haveria de crer
Num único motivo?

Se existem tantas cores e mesmo o corpo
Tem quatro sentidos?

E na pouca certeza dos livros ao chão
Entendo que mais que conhecimento
Vivo mesmo
É de colecionar por quês.

Jaci Rocha