Se vivo, Raul Seixas faria 10.074 anos hoje! – Por Silvio Neto

Por Silvio Neto

Decifre as entrelinhas dos hieróglifos das pirâmides do Egito, do calendário Maia, das Itacoatiaras de Ingá. Leia os símbolos sagrados de Umbanda, as centúrias de Nostradamus e o Tarot de Crowley… Não importa qual seja o mistério, todos serão unânimes em lhe revelar: Existe um cometa errante; uma estrela bailarina que vaga no abismo do espaço sem fim flamejando um rock e um grito! Em sua jornada, ele só passa pelo nosso planeta a cada dez mil anos. É quando ele renasce e encarna como um Moleque Maravilhoso, trazendo ao mundo à sua volta mudanças profundas no seu pensar e no seu comportamento.

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Sua derradeira passagem por aqui durou apenas 44 anos. Mas foi suficiente para que um país inteiro de dimensões continentais se tornasse menos careta. Há exatos 74 anos, quando ele chegou por aqui em mais uma de suas passagens, esse intrépido cometa trouxe em seu rastro a bomba atômica, em 1945, fechando um ciclo da Terra conhecido como velho Aeon e trazendo à luz o Novo Aeon materializado em forma de música. Era o dia 28 de junho. Aquele, foi o dia em que a Terra parou. Mas antes disso, ele usou de seus artifícios alquímicos e conseguiu juntar as águas do rio São Francisco e do rio Mississipi, criando a fusão perfeita do rock’n’roll de Elvis Presley com o baião de Luiz Gonzaga e como um novo Macunaíma desvairado gritou em cima do palco do III Festival Internacional da Canção (1971) “Let me sing, let me sing (my rock’n’roll)”!

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Seu nome é o contrário do luaR pois ele é um cometa iluminado. Em sua metamorfose ambulante pela Terra, se fez de maluco para revelar sua genialidade; brincou de cowboy para mostrar que preferia ser um fora-da-lei; acumulou riquezas e glórias por um tempo para mostrar que o ouro é para o tolo.

Esse ano, em agosto, já terão se passado 30 anos de sua última visita aqui no nosso planeta. Ainda assim, seu rastro é tão presente, tão vivo, que é como se ele ainda estivesse por aqui, cruzando o nosso céu. E assim como as estrelas que vemos são muitas vezes apenas o reflexo de milhões de anos-luz de corpos celestes que ainda nos impressionam a visão, o cometa Raul Seixas, brilhará na mente e no coração de milhares de fãs por muitos e muitos anos até, quem sabe, sua próxima passagem há dez mil anos…

Meu comentário: grande Raulzito. Um artista sensacional que inspirou e inspira muitos de nós, fãs. Tanto pelo fascínio da linha tênue entre a feliz loucura da autenticidade, quanto pela sinceridade à bruta, sempre poetizada em um rock and roll dos bons. Viva Raul! (Elton Tavares)

Tatamirô Grupo de Poesia se apresenta na programação da Mostra Tapiri

A Mostra Tapiri 2019 teve início na última terça-feira (25), com a participação de performances teatrais e apresentações musicais. Hoje a noite é de poesia com com a participação do grupo Tatamirô (AP).

Tatamirô apresenta recital “Palavr(arma)dura”

O Recital “Palavr(arma)dura” tem como foco a linguagem poética em suas múltiplas interações verbivocovisuais*. “Palavr(arma)dura” incorpora outras sonoridades (ruídos, distorções, sobreposição de vozes, poemas autorais e de outros poetas brasileiros e estrangeiros), criando texturas poéticas denominadas poemas sonoros.

A ficha técnica conta com: pesquisa multimídia, vocalização, percussão digital e sintetizadores – Herbert Emanuel; direção, vocalização, percussão digital e sintetizadores – Adriana Abreu; didgeridoo e morchang – Thamires Werneck; iluminação e concepção de figurino – Paulo Rocha; costureira – Ilce Rocha; e sonoplastia – Ezequias Corrêa.

Tatamirô Grupo de Poesia (AP)

É um grupo amapaense de declamação de textos poéticos, sejam eles escritos na forma de verso ou prosa, em suas múltiplas manifestações verbovocovisuais. Criado em 2008, atualmente tem um entreposto coração em São João Del Rei (MG), e nasceu do desejo de dizer poesia às pessoas, de colocar a voz a serviço da poesia, de dizer as coisas do mundo de forma diferente, além de fomentar várias ações e atividades em proveito da leitura, da literatura, principalmente, e das demais artes.

Mostra Tapiri 2019

A programação da Mostra Tapiri 2019 segue até o dia 01/07 . O evento é aberto ao público e não é cobrado entrada, apenas uma contribuição espontânea, como forma de apoiar os artistas, tendo em vista a mobilização dos grupos locais se propôs a apresentam suas produções de forma gratuita. Além das apresentações o Fórum Popular de Mulheres comercializa comidinhas e bebidinhas durante os dias de programação.

Fonte: Agenda Porto Velho

Poema de agora: EU TÔ CHEGANDO, BELÉM – Pat Andrade

EU TÔ CHEGANDO, BELÉM

pra me receber,
quero Waldemar encenando boas-vindas;
quero Ruy Barata com asas de miriti;
quero a chuva da tarde pra me lavar a alma;
quero o tacacá pra me aquecer o coração;
quero tua manga mais doce,
meu verso mais forte;
quero tua Praça mais bela,
minha mangueira mais velha;
quero tua noite mais louca,
minha avenida mais longa;
quero teu Largo do Carmo,
minha rua mais estreita;
quero tua Igreja Matriz,
meu Theatro da Paz,
quero meu Bar mais antigo,
meu garçom mais amigo.
quero a minha cidade
que tanto bem faz.

Pat Andrade

Poema de agora: Barbárie – (@cantigadeninar)

Barbárie

e foi assim:
um estrondo-estopim
é festa?
foguete?
a rua inteira desembesta
a correr.

na frente do campo de futebol
na frente de casa
no sol
de quatro horas da tarde
um corpo-massacre
em uma poça rasa

absurdo:
o barulho?
um tiro-certeiro
foi ciúme?
queima de arquivo?
naquele horário não passou carteiro,
só a Morte acertando em cheio.

esgoto a céu aberto
o povo boquiaberto
o homem na vala
da indiferença
e do desalento
cercado de gente que fala
sobre a sentença
do esquecimento

a polícia chegará logo
para fechar a avenida
a TV virá fazer filmagens
para o jornal do outro dia
transeuntes já compartilham imagens
pelo Whatsapp.

o homem-fulano
o homem-humano
o homem-na-sarjeta
tinha nome
e identidade
e agora repousa
sob raios ultravioleta

mas o perímetro
está ficando intrafegável
e preciso trabalhar.
é provável que a passagem
fique interrompida.
abro o portão com desgosto
sem sequer olhar
o rosto…

cúmplice-selvagem
da barbaridade
em meio ao zumzum,
sigo rumo a uma noite comum
na universidade.

Lara Utzig

Poema de agora: Cocadas ao sol – @juliomiragaia

Foto: Floriano Lima

Cocadas ao sol

Aqueles meninos vendendo
Cocadas suadas
Cansados de andar
Entre a poeira e a lama da zona norte

Aquela cocada de fome
Fedendo todas as suas tristezas
Como se a pobreza fosse um sol
Autoritário, forjado em calor

Aquela bandeja de ferro
Nas mãos amarelas dos meninos
A esquentar
Seus desesperos nus

Aqueles meninos transpiram
Nas praças
A vida que os leva
Ao abismo bélico do futuro

Aquela cocada estragada com a dor
De uma infância
Que não os está
E que não os será

Aquelas vidas aflitas
Em troca de cocadas
Suadas e silenciosas
No inchaço do ônibus lotado

Aqueles meninos estão
Roucos e dopados
ao meio dia da raiva
Das suas fomes

Aqueles meninos, cocadas
Aquelas cocadas ao sol
Aqueles meninos sem vida
Aqueles meninos na praça

Júlio Miragaia

Poema de agora: Palmas Proparoxítonas – Luiz Jorge Ferreira

Palmas Proparoxítonas

Uma estrela despenteada, sentada, sozinha, a beira da calçada, menstrua um punhado de luz de lua nova, sobre duas lembranças de Janeiro.
Eu vejo, escondido, detrás de um monte de Julhos.
E tento escrever em um vaso cheio de areia.
Um texto de Hamlet.


Quando de repente o farol de um carro sujo de lama e confete, espalha um clarão sobre minha face esquerda.
Há sobre ela, feito com carvão, um desenho de quebra cabeças, cheio de frases desconexas do Pequeno Príncipe em Birmânes.


Entrelaço dúzias de fiapos de manga que retiro dentes, e com eles adorno a cabeça calva da estrela, que vi no primeiro verso.

Meu coração fica com uma das asas machucadas.
E eu abraço ternamente a saudade, e o tempo que lentamente se afastam em direção às ruínas do Teatro.

Eu sou o Teatro, onde fingi, personagens minhas, para uma platéia entre espelhos, sou negro, e fui azul.
Fui chão e imitei voar.
Asas não as tinha , cuspiu nas costas, e as fiz brotar.
Ao rastejar senti vertigens, e nunca fui luz, moldei estrelas, fingi obtê-las da diagonal do esquecimento.
Onde a teia entre o passado amigo e futuro inseguro…brincam de amarelinha.

Para cantar escolhi Ode ao Silêncio…todos aplaudiram em Braile…
Amei ser o Oitavo.
Pulei feliz, até que fecharam as cortinas.


Um cheiro de naftalina,sentou ao meu lado na plateia.
O escuro deu- me as mãos, e julho temperamental, curvou os meus joelhos e me mergulhou no sal.

Dezenove de Julho, de Câncer, todo tatuado de meconio caminhei para o Sol.

Oitocentos e quarenta meses…corro coberto de mim, para escapar da chuva que menstrua lembranças tardias.

Oitocentos e quarenta meses…corro adiante de mim…fugindo da chuva…que molha minha sombra, sacode meu passado, nem me condena, nem me absolve, e promete inundar com meu drama lacrimoso …
Todas as telas apagadas das TVs desligadas dos Botecos de Vila Madalena.

Luiz Jorge Ferreira

* Do livro de Poemas “Nunca mais vou sair de mim sem levar as Asas” – Rumo Editorial – São Paulo.

Poema de agora: ELISA – Pat Andrade

ELISA

andava com ela,
pela madrugada,
a lua branca e bela,
de vermelha à prateada.
sempre na calada da noite,
se pintava de carmim…
seus beijos, como açoite,
eram usados contra mim.
depois durante o dia,
eu a vi, como nunca
pensei que veria…
me olhou, muda, e saiu,
sem dizer se voltaria

Pat Andrade

Poema de agora: Cheiro de Infância – Pat Andrade

CHEIRO DE INFÂNCIA

minha infância tem cheiro de lancheira
de mingau de maisena
de boneca velha
de caderno novo
minha infância tem cheiro de gemada
de pão com manteiga
e café fresquinho
de tapioca e beiju
Minha infância tem cheiro de Phebo
copaíba e andiroba
tem cheiro de mato,
tem cheiro de vela
tem cheiro de avô.
minha infância tem cheiro de arraial
de camarão cozido
e peixe assado
tem cheiro de comida da vovó.
minha infância tem cheiro de quando eu crescer
de fruta fresca, colhida no pé
tem cheiro de roupa quarada com anil
minha infância tem cheiro de igarapé
de água fria, de bater o queixo
e engelhar os dedos
minha infância tem cheiro de interior,
de quintal molhado de chuva
de grama aparadinha, de folha seca
de sapoti
minha infância tem cheiro de saudade

Pat Andrade

O poeta e professor Carlos Nilson Costa – Antologia e Iconografia

Carlos Nilson em Veneza_ 2014
Professor Carlos Nilson em Veneza (ITA) – 2014

Por Paulo Tarso Barros

O professor Carlos Nilson Costa nasceu em Monte Alegre (PA), no dia 17 de novembro de 1941, mas chegou ao Amapá ainda muito jovem e aqui estudou, constituiu a família e realizou seus projetos profissionais e pessoais. Artista plástico, poeta, professor e um admirável ser humano, Carlos Nilson é formado em Matemática e tem especialização em Planejamento. Foi Secretário Municipal de Educação de Macapá, Secretário de Estado da Educação e integrante do Conselho Estadual de Educação, dentre outras atividades que exerceu no serviço público com grande destaque, pela sua competência e dedicação, o que o coloca entre os mais notáveis educadores do nosso Estado.

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Na imprensa publicou trabalhos nos jornais “Amapá”, “A Voz católica”, “A Fronteira”, “O Liberal” e “Jornal do Dia” e apresentou programas de música erudita nas rádios Difusora e Educadora.

Participou da antologia “Coletânea Amapaense”, de 1989.

Neste especial, vamos publicar uma seleção de poemas do autor – inclusive fac-símiles de publicações dos anos 60 do jornal Amapá.

 Poema de Carlos Nilson (1)Carlos Nilson_poema Descolorido_Jornal A Voz Católica_

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O SOM DO SILÊNCIO

Por que buscas
na tortura de teu silêncio,
o sopro da ventura favorável?
Amargo e torturante é o teu calar!

Infiltra-te na imensidão de tua voz
E traz à tona a alegria contagiante
E companheira
De nunca estar só!

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CÍRCULO

Daquela festa passada
Deixaste apenas o cavalo
Da carruagem que viajamos

Da tua fuga galopante,
No exílio angustiante que fiquei,
Restou o cavalo, que era a égua de nossa glória.

A distância do tempo que partiste
Voltou, em circunferência,
A encontrar, no ponto de partida,
A égua para a tua condução.

Fiquei a esperar a carruagem
Que viria buscar a montaria
Na fuga causada do amor perdido
Na espera fogosa do amor encontrado

Cantico delle Anime, di Roberto Ferri

TERNURA

Sinto a ternura
Feita de carne
– o teu corpo
O tempero de tua alma
leva-me saudade
de tua ausência presente

A imaginação do amor
constante
que desejo
é o mesmo amor
que sinto em ti
Mulher amada

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RAZÃO DO AMOR

Muitos cantam a vitória
em hinos que sublimam as conquistas
( em verdade, gostamos de cantar nossas glórias
nem tanto gloriosas assim )!

Eu canto o teu amor
que lampeja
na vez que recordo
teu ar triste
que, cinematograficamente,
reflete ternura
de uma lembrança viva.

Não sou grato ao teu amor!
Nem busco a razão,
já que não amo
porque quero,
mas se quisesse
te amaria mesmo assim.

Uecsa

LEMBRANÇA DE MINHA RUA

Lembro como se fosse presente
do primeiro dia em que cheguei
-tinha sete anos!
Fazia escuro
O mato crescia em terra estéril
e o cemitério era panorama mudo e
suas paredes cinzentas tinham o ar melancólico
daquele lugar.
Macapá terminava ali!

A rua era pequena
-Nem pensei que fosse beco!
Terminava no campo santo
As casas, em perfeito alinhamento
-uma longe da outra
Davam uma visão de que havia ordem
também por lá.

A casa onde fui morar
Era toda de barro. Estava caindo aos pedaços.
Cada um era uma parte do coração de minha mãe que ruia.
O mato crescia (como ele viceja em terra imprópria! ),
E brotavam algumas flores silvestres
Que faziam o jardim dali.

Rua, saudade de minha infância.
Das brincadeiras infantis
-de cowboys,
Apedrejador de passarinhos…
Hoje é avenida sem deixar a forma de beco

Rua da minha felicidade
E da minha tristeza,
Que no sorrir de minha existência,
Quando brotava para a vida
Na pós-adolescência,
Viste morto meu pai .

Rua triste, de onde não tive namorada.
– ela só veio depois que mudou o nome.
Rua querida, és saudade perene,
Vida em minha existência
Tão triste e só,
Oferecendo lembranças e saudades
Que parece não saem de lá.

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PENSAR BAIXINHO

Hoje volto:
Triste e pensativo…..
-a noite cai
E o silêncio vive a solidão.
Hoje é noite de ficar sozinho,
de pensar baixinho,
de pedir aos céus
o que não podemos na terra.
De fechar os olhos,
De chorar calado
E esperar a volta,
Que sabemos não vem:
Noite de ficar sozinho.

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ANJO DA GUARDA

Simplesmente dormi!
Meu anjo cansou-se de velar por mim
-teve sono e entregou-se a Morfeu.

Nos lampejos da vida,
com sede de afeto,
me precipitei a realizar.

Pobre de meu anjo,
Teve que dormir um pouco!
Fiquei só!
Perdi-me no caminho.
Andei errante: fugi demais.

Agora,
Tudo é frio.
O peito gela
O coração treme solitário
E irrealizável.
Por que dormi,
se tinha tanto a completar?
-e meu anjo, pobre coitado,
Não sei onde o encontrar.

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MINUTO ETERNO

Houve um minuto!
Os sinos deixaram de anunciar,
Mas o tempo chegou.
O tempo não passa, ele chega.

Os homens não param, esperando o fim.
…..Paira uma enorme expectativa
De no momento findo,
Haver o começo de novo.

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MÃE PRETA

A sombra do mundo
E o brilho do bem,
Escondem na sombra
O belo do amor.

Mãe Preta querida
Teu canto é passado
Na dor do passado
Que teu avo não contou.

Teu filho que dorme
O sono do nobre,
Não sabe de angústias vividas
Não sabe que lágrimas
Que o tempo esqueceu,
Rolaram baixinho
Nos prantos noturnos
Dos fundos dos barcos

Teu canto adormece
É diferente
Traz na tua voz
Mensagem antiga
Da dor já passada.
Não fala de bola,
Nem de brinquedos.
Só canta ternura
Do bem de tua alma

Mãe Preta querida,
Canta prá mim.
Tuas mãos calejadas,
Teu rosto queimado,
Teu corpo sofrido,
Mãe Preta
Só falam de amor.

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DESMATERIALIZADO

Deixo cair a carcaça e caminho…
Vou seguindo na terra
Como se fosse um espectro,
Sem resistência do ar

Deixo cair as vestes dos ossos,
E nu, o meu esqueleto vai procurar abrigo
Em uma tumba de glória,
Onde a árvore nasce em forma de espada
Ferindo as dores na solidão.

Assim, descaço de carnes,
Sem cabelos,
Sem rumo determinado,
Mas com chegada certa em uma luz,
Estendo minhas mãos de falanges
E imploro a felicidade
-ao menos uma vez.
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O RIO

Corre,
Margeando o leito calmo,
A folha caída.

Segue,
No caminhar constante
Levando lembranças
E saudades.

Vai,
Misturando às águas,
O barro santo
De vidas passadas.

E, com a terra sagrada,
Diluída na garapa gigante,
Desliza a tradição ferida
De um povo bravo e forte.

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A ROTA DO HOMEM

Acho simples voar
-até as aves voam!
Num voo curto e material
Sem a magnitude
Dos homens,
Que sobem tanto
E se perdem na grandeza
De um sorriso tácito
Bebido em taça
Com o gosto de cru.

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MORTE DOS NAMORADOS

Como é triste a morte dos namorados
Mas dos que se amam
Não dos que se falam
Mas dos que se sentem

Noites claras que brilham,
Passeios,
Encontros.
Tudo transformado em noite fria
-eternamente fria.

O calor dos beijos
Foi trocado pelo frio dos mármores
Na visão branca
Como o fantasma da saudade.
E a mão
O beijo
O calor:
Como estão gelados!

Todo o calor da imensidão da noite
Agora é eterna noite das coisa geladas
E de muita solidão.

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ONTEM, HOJE E ……….AMANHÃ

Enquanto as rosas perfumarem o sereno,
O sorriso da criança entreabrir,
E nos campos se amarem as borboletas,
Acredita, sou feliz.

Após, no pomar, as árvores derem frutos,
E os galos entoarem na madrugada,
E o seresteiro amar sua namorada.
Acredita, eu vivo.

E se ainda as folhas formam copas,
E poucas flores ainda existirem,
Mesmo assim, vacilante,
Acredita, eu existo.

Mas, se as árvores não brotam ramos,
E as pétalas caem no chão
E somente o arbusto cresce em saudade,
Acredita, sou ontem.

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EROSÃO

Na areia fina da praia
Está o pássaro ferido
-caído.

Na pedra lisa do riacho,
Está o velho pescador
-pescando.

Na brisa lenta do Amazonas
Estão as ondas tristes
Chegando.

E o pássaro caído,
Morto na praia
Mudo, deixou de cantar.

E a pedra gasta,
Continente ontem,
Desfez-se: erosão

E a brisa lenta
…muito lenta
Parou.

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O HORIZONTE

Que busca o homem ao olhar o horizonte
Que busca ele, achar em sua melancolia silenciosa, na imensidão das águas e na grandeza do céu?

Ele diante da distância é pequeno!
Busca no perder de vista,
Seu pensamento disperso.
Tenta o encontro da água com o céu
E chega ao êxtase
Arrancado das entranhas deste horizonte perdido
E vem
Docemente
De coração saciado,
Rezar a oração do amor.

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AO MEU PAI

Lampeja vibrante
A chama indormida
Do cintilante clarão da vida

Segue…
Ilumina o caminhar
De conquistas passadas
E das que ainda vão ocorrer

…e é tão grande a sua luz,
Que não precisa de séquito.
Este é o seu rastro de brilho
A clarear o caminho
Na ida segura.
E a chama revolta
Ilumina a saudade
-grande e profunda
Que ainda arde
Com a separação.

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ANJO DA GUARDA

Dormi muito!
Meu anjo cansou-se de velar por mim
-teve insônia

No balburdio da vida,
Com sede de afeto,
Me precipitei a realizar.

Pobre do meu anjo,
Teve que dormir um pouco!
Fiquei só.
Perdi-me no caminho.
Andei errante: -fugi demais.

Agora,
Tudo é frio
O peito gela
O coração treme solitário
E omisso.

Por que dormi
Se tinha tanto a completar?
E meu anjo, pobre coitado,
Não sei onde o encontrar.

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HOJE OU NUNCA

Não perca tempo,
Pois estou a esperar.
Vem enquanto és flor
Com orvalho
Na manhã radiosa.

Vem,
Enquanto não murchas,
Pois como a flor,
O tempo fadiga
E mata
Não esquece
Que estas deixarão
De ter perfumes
E de ser belas.

E tu,
Hoje linda,
Perfumada e viva
E amanhã
Feia e morta.

Longo tempo
Te espero
Para que não sintas
Como a flor
A queda para a volta
À terra
Com renúncia
E humilhação.

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NOITE SEM ESTRELAS

Despreocupado
em dia de meditação a vagar,
achei uma noite
tosca e sem estrelas
com malícia e ríspida.

Num dia sem sol,
Quando parava a natureza,
Descobri uma noite.
Dessas escuras,
E propícias para o medo
onde nossa oração é ouvida
Como eco.

Em um dia comum,
Achei uma noite.
-a minha,
Estranhamente bela
E misteriosa,
Onde a brisa vinha em forma de afago.

Em infinitos dias
Achei uma noite,
E nessa noite infinita
Achei um amor.

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DECLARAÇÃO

De todas as criaturas viventes
As fêmeas são mais astutas
E a mulher a mais buscada,
Procurada e fugidia.
Este sublime ser
Converge as luzes
e mantém o segredo da vida.
De tal forma é soberana
Que agasalha por nove meses
Um ser que quando livre
Chora a separação.

Assim, é a mulher a perfeição
Buscada no inatingível
Sopro do amor.

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SIMPLESMENTE

Gosto de teu sorriso
Pelas coisas simples
Que ele tem

Igualmente aprecio o voo cósmico,
Porque acho que é simples;
Pois sobe, e leve,
Não deixa que a poeira
Venha a corrompe-lo
E tirar a sua pureza

A beleza e a simplicidade são irmãs
-no riso
-na carne,
-no espírito
-e na visão.

Assim,
gosto do teu sorriso
pelas coisas simples
que ele tem.

Carlos Nilson falando
Professor e poeta Carlos Nilson.

*Carlos Nilson foi amigo de meu falecido pai e também do meu saudoso tio Ita. Ele é pai dos amigos Carlos, Cláudio, Verê e Tayná, além de marido da querida Regina. Nas minhas mais antigas lembranças, recordo do professor, poeta e educador sempre coerente, muitíssimo inteligente e gentil. A ele, meus parabéns pelo conjunto da obra.

Elton Tavares

Fonte: Escritores do Amapá

Poema de agora: PAPEL NO PAINEL – Luiz Jorge Ferreira

PAPEL NO PAINEL

Na minha cabeça, milhares de Universos.
Defronte de meu carro parado no estacionamento do Carrefour , tão vazio como o Saara.
Apenas um cão magro faz companhia e se preocupa com sua Sarna abundante, suas meia duzias de pulgas magras também, e com uma multidão de formigas de fogo, em fila, que estão assustadas com o Sol refletido no cimento da calçada.


Para descer e sair caminhando terei que chutar uma estrela que ali amanheceu, com certeza se esqueceu de alcançar voo até a Constelação de Cirius.
Doem meus dedos, ando digitando demais, usarei mais a voz para falar com o eco, e alojarei pensamentos no espaço incomensurável dos neurônios, para estende-los da década de Cincoenta, até agora neste momento em que leio 12.53, de 19.04.2019.

Entrarei na sétima década…Faunos.Sacis.
Fadas. Yaras e Gnomos, nunca os vi.
Vejo solitário o estacionamento do Carrefour…
Dou por mim , noto a ausência da silhueta heptagonal daquela estrela.
Pode ter subido célere como sugada por um buraco negro.


Pode estar no terceiro banco, a direita, da Igreja de Nossa Senhora de Nazaré em Macapá.
Ouvindo Deus calar a fala dos Padres.
Pode estar em Viseu, pondo os pés frios na lama toda marcada das patas dos caranguejos.
Ou pode estar entre os milhares de Universos que abrigo entre os neurônios do meu cérebro.


Onde estiver perambulando, será bem vinda.
Pode ter levado as pulgas, as formigas, o cão, e as sombras.
Tudo sumiu em um piscar de olhos.
Por Deus, assim que eu sorrir, todos serão bem vindos.

Luiz Jorge Ferreira

 

* Do livro de Poemas “Nunca mais vou sair de mim sem levar as Asas” – Rumo Editorial – São Paulo.