Nem sempre nos garantimos – Crônica de Elton Tavares – *Do livro “Papos de Rocha e outras crônicas no meio do mundo”

Crônica de Elton Tavares

Em 2012, fui convidado por uma amiga para falar sobre o lance de ser editor de site. Era uma palestra ou algo parecido. Expliquei-lhe que minhas atribuições e horários não permitiriam que eu aceitasse seu convite, mas adorei. Afinal, é um reconhecimento. Ano passado, outro convite sobre o tema e para outra instituição de Ensino Superior.

Logo, lembrei que, há tempos, disse à uma jornalista: “nem sempre conseguimos ser brilhantes”. Acredito mesmo nisso (pior é quem nunca é). Como falar em público de uma atividade que não sei se domino bem? Como ensinar sem saber? Aliás, sou péssimo nesse papo de falar em público.

Conheço muita gente que escreve bem pra caramba. Inclusive pessoas que não são jornalistas, blogueiros, professores, advogados ou seja lá qual a área de atuação que exija (no mínimo) uma redação “marrômeno”. Aliás, sou fã dos textos de várias figuras amapaenses. Eles usam o hemisfério esquerdo do cérebro e conseguem redigir as coisas de forma diferente, irreverente ou não, mas sempre inteligente.

Voltando ao convite, como falar das minhas opiniões, meus “achismos”, minhas conclusões (às vezes errôneas e precipitadas) e minhas imposições, sobretudo musicais? Esse negócio é sério. Muito sério. Pois são as minhas verdades e pontos de vista.

No “De Rocha” falo de coisas sérias, divulgo cultura, publico poesias, músicas, fotografias, ajudo na cena artística, entre outras “paideguices”. Mas, se der na telha, escrevo ou publico doidices e até coloco palavrões nos escritos.

“Os palavrões não nasceram por acaso. São recursos extremamente válidos e criativos para prover nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade nossos mais fortes e genuínos sentimentos”, dizia o saudoso Millôr Fernandes.

Sou fã dos blogs e sites que possuem conteúdos jornalísticos e culturais. Existem páginas com muita qualidade. Mas detesto aqueles que são meramente repetidores de textos de terceiros. Se você se propõe a ter uma página na internet, escreva!

Ser editor de um site é ter sacada, emitir opinião, dar a cara a tapas, ter responsabilidade para não difamar e jamais se achar o dono da verdade. Adoro o fato de minha página eletrônica ter caído nas graças de muitos leitores.

Escrevo, quase sempre, de improviso.

Mas há períodos de entressafra das ideias, em que fico sem inspiração diante do computador. São os e-mails com releases culturais ou informativos, além dos meus colaboradores, que me salvam. Quem dera fosse só querer e baixasse o espírito de Rui Barbosa e eu começasse a redigir como um gênio.

Seria firmeza!

Trocando em miúdos, aqui discutimos o sexo dos anjos, falamos de coisas sérias, de jornalismo, diversão e arte. Mas também perdemos tempo com bobagens. Por que não? Sempre brinco e digo que sou um jornalista de bastidores, pois apurar e escrever é tranquilo. Já falar em público, rádio ou TV, é difícil. Aceito a limitação e gosto de como trabalho.

Sei que tem muita gente preparada para falar sobre blogs, jornalismo e o mundo midiático. Eu não. Acredito que é preciso humildade para assumir quando não nos garantimos sobre alguns temas. Afinal, nem sempre nos garantimos ou somos brilhantes. Pelos menos não como algumas pessoas acham que somos.

Republiquei essa crônica hoje por conta de um evento amanhã, o Folia Literária, que participarei e terei que falar em público. Tô aqui repassando o material e morto de nervoso e ansioso (risos). Queria que minha apresentação de amanhã fosse como esse vídeo acima (mais risos). É isso. Bom resto de sábado para todos nós!

*Do livro “Papos de Rocha e outras crônicas no meio do mundo”, de minha autoria, lançado em 2021.

 

Os 28 anos do álbum “Mellon Collie And The Infinite Sadness”, do Smashing Pumpkins #TheSmashingPumpkins

Parece que foi ontem, mas já faz 28 anos que a banda de rock alternativo norte-americana The Smashing Pumpkins lançou o magnífico álbum “Mellon Collie and the Infinite Sadness” (em 23 de outubro de 1995 pela Virgin Records).

Este é o terceiro disco da carreira do grupo liderado por Billy Corgan (o careca antipático do rock sabe fazer canções que tocam a alma e o coração). É o álbum mais famoso da banda e emplacou hits como “Bullet with Butterfly Wings”, “Tonight Tonight”, “1979” e outros.

Mellon Collie foi o álbum que definiu a cara do rock na época. Um clássico instantâneo que provou que a música alternativa poderia ser complexa e ambiciosa.

Billy Corgan se encontrava no auge da sua megalomania criativa e lapidou todas as músicas com muita astúcia; desde sua introdução instrumental até a última música, o disco é arrebatador.

Ele contém muitas canções sensacionais, como a beleza da instrumental Mellon Collie And The Infinite Sadness, a visceralidade de “Zero” e “Bullet with Butterfly Wings”, a saudade dramática de “Thirty-Three”, a inocência de “1979” e a aula de vivência em “Tonight, Tonight”. Isso para citar somente as que gostamos mais.

O disco recebeu, com a canção “Bullet with Butterfly Wings”, o Grammy de 1997. A obra foi eleita como 29º maior álbum de todos os tempos, em 1998, pela Revista Q. Em 2003, a revista Rolling Stones o colocou como um dos 500 melhores discos de todos os tempos, no 487ª lugar.

A Revista Time elegeu Mellon Collie and the Infinite Sadness o melhor álbum de 1995. Não à toa, ele está na lista dos 200 álbuns definitivos no Rock and Roll Hall of Fame.

O disco é eclético dentro do rock, já que possui desde canções bem melodiosas até rock pesado com guitarras sujas e gritos de FUCK YOUUU!. É realmente um álbum memorável, com um apelo artístico fantástico (sem falar naquele encarte sensacional).

Em 1995, Kurt Cobain já tinha ido para as estrelas e tudo que surgia de genial era mais uma esperança. No final, sabemos que o Rock nunca morre. Ele adoece, mas sempre volta com tudo.

Até hoje as músicas de Mellon Collie emocionam e transportam no tempo quem tem mais de 40 anos. Sim, nostálgico. Agora é só escutar Tonight, Tonight, onde o velho Corgan canta “acredite em mim” ou 1979 e viajar no tempo.

Elton Tavares e André Mont’Alverne

PORCA – Conto de Fernando Canto

Conto de Fernando Canto

Eu insistia com ela todas as noites de lua cheia.

– Para com essa história de se transformar em porca, mulher. Não aguento mais esse cheiro de lama.

Era um segredo nosso que tive de aceitar por pura dependência financeira, desde que nos casamos. Mas ela não parava. Queria porque queria parecer melhor que a Velha Xambica, do sítio do seu Ladislau, vizinho ao nosso, que tinha o mesmo fado dela e se transfigurava em Matinta. As duas concorriam para ver quem assustava mais as pessoas desprevenidas nas noites enluaradas da minha cidadezinha.

Um dia eu estava num couro doido, numa pindaíba roxíssima. Era meu aniversário e eu vivia sempre cobrado pelos meus amigos do boteco da Waldirene Boca de Tambor.

– Quando é o churrasco, porra? Perguntavam o tempo todo, me pressionando pra valer.

Eu dizia que ia depender da indenização que estava para receber do frigorífico que fui botado injustamente pra fora, sem justa causa. O processo estava tramitando há tempos, sempre acompanhado de perto pelo iminente causídico Dr. Robário Paladino, que me garantiu o recebimento para logo, antes do fim do mês.

Na véspera do aniversário eu não aguentei mais o fedor da minha galega. Ela havia voltado de um Passeio de Assustamento da lua cheia e estava no quintal grunhindo e chafurdando na lama do chiqueiro, antes de voltar a ser mulher. Ela dizia sempre que a transformação era um processo doloroso, mas que tinha prazer em fazer sempre, pois se achava renovada toda vez que isso acontecia.

Ela estava lá. Tinha acabado de chegar. Eu fiquei pensando, pensando, pensando… peguei a peixeira e a enterrei no pescoço dela por trás. A porca revirou os olhos e o sangue esguichou com tanta força que me sujou todo. Estrebuchou e deu três longos e desesperados grunhidos. Enrolei a boca e o focinho com uma corda até ela parar de se debater. Depois coloquei o corpo em um camburão de água fervente para raspar os pelos, e, como bom açougueiro, comecei a preparar o corpo do animal para fazer um belo churrasco. Os raios do dia chegaram com uma intensidade que me feriu os olhos.

Fui ao boteco da Waldirene Boca de Tambor e convidei a rapaziada malandra pro churrasco. E ainda dizia, brincando:

– Levem um presente, seus vadios. Cheguem perto do meio-dia pra me ajudarem a assar.

Cada um se servia como podia. Eu havia trocado os miúdos da porca por cachaça e farinha com a Wal. Todo mundo se refestelou e ficou de bucho cheio. Tomaram cachaça à beça, arranjaram uns tambores e o batuque correu o dia todo. Quem chegava pro churrasco também trazia uma bebida. Mas eu não tive coragem de comer nenhum pedaço de carne, talvez em respeito à minha falecida mulher.

Já era quase meia noite e todo mundo já estava “calibrado”, tomando cachaça e dançando uns sambas de cacete. Ninguém notou a ausência da minha galeguinha, só o Ambrósio, saliente que só ele. E eu lhe disse que ela tinha ido à casa da mãe doente lá em Mazagão.

A lua rompeu uma nuvem escura e iluminou mais ainda o terreiro da festa. E o batuque ensurdecia e ecoava em toda a área.

Mas tudo parou de repente quando uma mulher idosa com bico de pássaro surgiu perto da mata onde ficava o chiqueiro da minha esposa.

– Quero tabaco, ela dizia. Quero tabaco pra levar pra minha comadre.

Os convidados se entreolharam e o medo tomou conta de todos. Atônitos viram seus ventres se mexerem involuntariamente e em todos eles uma voz dizia:

– Onde está minha costela? Cadê minhas coxas? Quede meu peito?

A lua parecia descer do céu de tão grande, naquele momento de desespero dos convidados. E todos eles saíram correndo para o mato se transformando a cada passo em caititus, porcos-do-mato, queixadas e javalis.

A velha Matinta me olhou de soslaio, cuspiu pelo bico de pássaro um cuspo negro de quem masca tabaco. Eu caí de costas no chão e tive que sustentar com os braços até de manhã a lua quase cheia que parecia ter caído em cima de mim.

Criança diz cada uma…- Crônica de Ronaldo Rodrigues

Crônica de Ronaldo Rodrigues

“Criança diz cada uma” era uma seção da revista Pais & Filhos que eu gostava de ler, no começo dos anos 1980. A página, assinada por Pedro Bloch, jornalista e médico foniatra, pioneiro na área de fonoaudiologia, era um painel humorístico que explorava muito bem a lógica que só criança tem. Ele anotava tudo o que as crianças consultadas por ele diziam/faziam. Eu também tinha essa mania, anotar coisas que meus sobrinhos diziam/faziam, e sabia que um dia iria publicar. Acrescentando tiradas dos meus filhos, filhos e sobrinhos de amigos, apresento aqui e agora esses flagrantes de inteligência infantil.
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Meu sobrinho Rodrigo, após longa reflexão:
– Tio! Dinheiro custa caro, né?
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Meu filho Pedro: Pai, droga não é proibida?
Eu: Sim, filho. É proibida.
Pedro: E por que tem tanta drogaria na cidade?
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De novo o Pedro. Era período de horário eleitoral gratuito na televisão, o Pedro trocando de canal e vendo sempre a mesma programação: o candidato falando das suas propostas. Aí, vendo que só tinha aquilo em todos os canais, me saiu com esta:
– Pai, estamos cercados!
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Meu filho Artur, naquela fase de imitação de bichos.
– Como é que o cachorro faz, Artur?
– Au! Au!
– E o gato?
– Miaaau!
– E a vaquinha?
– Muuuuuuu!
– E o pintinho?
– Tá ati! Falou o Artur, apontando para o próprio.
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Esta foi com o Lucas, sobrinho do Manoel. Cheguei à casa dos dois quando o Manoel tinha saído pra tirar cópia da chave:
– E aí, Lucas? Cadê teu tio?
– Foi tirar xerox da chave!
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O Arthur, filho da Telmah, vendo os garis recolhendo o lixo:
– Mãe! Tão roubando todo o nosso lixo!
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Diálogos entre a mãe Karen e a filha Clarice.
Clarice: Voxê vai tabalhar de novo?
Karen: Vou sim!
Clarice: Eu quero tabalhar também… como pinxesa!

Karen: Clarice, você tá com sono?
Clarice: Não! Tô feliz!

Karen: Clarice, que música é essa que estás cantando?
Clarice: A música da tua vida!
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Gabriel, filho da Tânia e do Marcelo.
Gabriel chegou da escola descabelado, com a roupa suja e amassada.
Tânia: Gabriel, eu vou à tua escola ver como andas.
Gabriel: Precisa ir à escola pra ver como eu ando? Eu ando assim, mãe, ó…
Deu uns quatro passos e disse:
– Mãe, a senhora fala cada besteira…

Tânia estava dirigindo e ouvindo Legião Urbana. No carro, estavam a mãe e a tia da Tânia, duas senhoras muito recatadas, e o Gabriel. Eis que entra a parte em que o Renato Russo diz “Se não for masturbação, use camisinha”. Gabriel virou para a avó:
– Vó, o que é masturbação? A senhora pode me ensinar com detalhes?

Tânia e Gabriel entram num ônibus lotado e uma senhora, muito solícita, se oferece para que Gabriel prossiga a viagem sentado em seu colo. A senhora puxa conversa com Gabriel:
– E você gosta de fazer o quê?
– Gosto de ouvir música.
– Que bom! Eu também adoro música! Gosto do Calipso, gosto do Luan Santana, gosto da…
Gabriel, com a franqueza brutal das crianças, interveio:
– Poxa! A senhora só gosta de música ruim!
E a cara da Tânia ficou onde?
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Vem história da Espanha, onde vivem a mãe Ana Cláudia e a filha Ana Belén.
Ana Belén estava com um pouco de tosse e ouviu Ana Cláudia dizer que, dependendo de como passasse aquela noite, iria ou não pro colégio no dia seguinte. Quando amanheceu, ela começou a tossir (forçando a tosse) e a mãe Ana reclamou:
– Ana Belén, você não tossiu a noite toda! Como começou a tossir só agora, justo na hora de ir pro colégio?
– Claro, mamãe! Eu estava dormindo, como ia tossir?
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Andréa falando sobre o sobrinho Leonardo.
Eu estava vestida com uma daquelas roupas velhinhas e confortáveis que gostamos de vestir em casa. Ele me olhou seriamente e disse:
– Coitadinha da titia, tão pobrezinha! Usando um vestido toooodo furado!

Uma criança reconhece a inocência de um animal. A Amanda, enquanto brincava com o Aslam:
– Tia Andréa, às vezes eu esqueço que o Aslam é um cachorro. Ele parece uma gente criança.
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Cleia contando histórias da Laura.
Laura havia se afastado da gente na praia e ficamos 20 minutos procurando por ela. A encontramos brincando com areia debaixo de uma mesa, distante de nós.
Depois de termos falado sobre isso por uma semana, voltamos à praia e, num momento em que Laura estava novamente brincando na areia, alguém vai até ela e pergunta:
– Está bem, Laura?
Ela olha pro alto e, com toda a inocência, pergunta:
– Tô perdida?

Outra da Laura.
Mãe e filha passeando pela cidade.
– Mãe, bora comprar sorvete?
– Não temos dinheiro!
– Então, bora comprar dinheiro?

Cleia e o sobrinho Herbert.
Em visita ao filho da Cleia, que tinha acabado de nascer, Herbert olha o bebê no berço e logo pergunta:
– Quanto custou?
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Quem vai querer refrigerante? E a Luana responde:
– Eu quero uma Santa Uva!
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O Enzo, após dar um arroto daqueles:
– Ops! Amarrotei!
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– Mãe, me dá um irmãozinho?
– Mas como vou te dar um irmãozinho?
– A gente compra! Passa no cartão e depois a gente recebe na portaria!
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E os dialetos que as crianças inventam? O Rauan quando queria tomar água:
– Gapiaga!
E quando queria jogar videogame:
– Gapiogôgo!
Bom, a família tinha que se esforçar um pouco, mas acabava entendendo.
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Mateus falando para o pai Marcelo:
– Pai, tô com uma África na boca!
Era afta, mas ele não deixa de ter razão. A África está mesmo por toda parte de nós.
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Meu grande amigo e agora vovô, Euclides foi interpelado pela Maria Eduarda, de 4 anos:
– Vô, por que você não arruma sua mesa de trabalho como pede pra eu fazer com as minhas coisas?
Euclides se recolheu a um silêncio envergonhado, mas sorridente, e tratou de arrumar a mesa.
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– Tio, o senhor vai brincar comigo ou ficar bêbido com o meu pai?
Perguntou a Maitê, sobrinha do Elton. O meu amigo, claro, preferiu brincar com a menina. Sábia escolha.
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Nesta história, personagens reais, nomes fictícios. Vai que a criança, hoje adulta, fique constrangida.
José Nilson levou seu filho Eduardo para o trabalho. Ficaram os dois na sala, José Nilson trabalhando e o filho lendo uns gibis. O menino ficou tão distraído que não notou a moça da limpeza entrar. De repente, ele fala para o José Nilson:
– Pai, eu quero pei…
Antes de terminar a frase, ele nota a presença da moça, fica envergonhado e sai correndo da sala. Até hoje permanece esse mistério: o que será que ele queria fazer?
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É isto. Vou recolher mais histórias e, quem sabe, não sai uma continuação desta crônica? Mandem aí.

O assessor sim senhor – Crônica de Edi Prado (@PradoEdi)

Crônica de Edi Prado

Por definição clássica, o assessor é o assistente, adjunto, auxiliar; coadjutor; ajudante. Pessoa colocada como adjunto ou assistente ou participante de funções de outrem. Mas deve estar havendo a inversão de função. O assessor, talvez por desconhecer o significado da função, o princípio, ou não está preparado para o cargo, figura muitas vezes, como o personagem mais importante que o assessorado. E quase sempre é uma barreira de acesso ao assessorado. Na verdade o assessor está sendo o algoz que tira a liberdade e apaga os holofotes, para poder conduzir o assessorado em direção ao ostracismo, quando ele ainda é o ator principal.

O assessor faz quase tudo o que não deveria e se esquece de preparar para cumprir com a função dele, que é o de assessorar, informar, subsidiar com informações inerentes às atividades profissionais dele. É quase como o dar o passe perfeito para o gol. A relação com a imprensa se complica ainda mais, porque ao esmerar-se em proteger o chefe cria tantas dificuldades que fica mais cômodo pautar outra pessoa.

O pior é quando mais se precisa ouvir uma declaração ou até mesmo conceder a oportunidade de defender-se durante o ataque, o assessor informa que ele não pode atender por estar em eternas reuniões ou pede para “passar amanhã”. Só que amanhã a imagem já estará manchada e tarde demais. E muitas das vezes o chefe nem sabe o que está se passando, porque as informações não chegam ou chegam distorcidas ou muito torcidas, quando a realidade é catastrófica e bem avessa a que chega, quando era mais prudente prevenir do que tentar remediar.

As notícias dos meios de comunicação estão fartas de exemplos. Como a de um prefeito de uma grande capital, por estar blindado contra informações desconfortáveis, resolveu visitar um bairro onde a imagem dele era o símbolo do descaso. O assessor não pode impedir a constrangedora situação e ganhou, como brinde, algumas ovadas no paletó impecável. Ficou com a imagem literalmente suja e mal cheirosa. Situação que poderia ser evitada se houvesse preocupação com o protegido dele e com ele, mesmo.

O bom assessor não é o que “filtra” a notícia. É o que leva junto as sugestões para contornar a situação, depois de ouvir outras pessoas mais experientes. Mentir é desaconselhável. Haverá sempre alguém para instigar e “esticar” o assunto. Assumir o erro e garantir o reparo afasta especulação e dá o assunto como encerrado, aconselham os consultores, depois de passar por situações embaraçosas.

O assessor que se preza e pretende manter-se no cargo, não deve jamais se incompatibilizar com a imprensa nem deixá-la sem informações, nem que seja sobre outro assunto interessante. Chá de banco nem pensar. Cada repórter tem no mínimo três pautas. E se a espera for a causa do repórter “furar”a pauta dele fique certo de que o assessorado terá tratamento “vip” no primeiro tropeço.

O assessor deve ter uma relação de camaradagem com a imprensa; facilitar ao máximo o trabalho do repórter. Garantir o acesso para fotos e imagens, quando o encontro não for aberto à imprensa. Nada de exageros nem protecionismo. O que está ocorrendo e de forma ostensiva são assessores cão de guarda rosnando para a própria sombra. A continuar assim, não se queixe que a imprensa não dá importância ao assessorado, a empresa ou o órgão que ele representa.

O problema pode está sendo você, assessor, que não compreendeu que não é o astro. Apenas um lanterninha que conduz o assessorado para a poltrona individual e indivisível. Caso você nunca esteve do outro lado, na redação, cuidado: você ainda pode ir para lá. E mais cuidado ainda com os colegas de trabalho. Um dia, quem você atrasou a vida, pode ser o seu chefe.

Roberto Carlos de Santana, meu louco favorito – Crônica de Fernando Canto (republicada por conta do Dia Mundial da Saúde Mental)

Crônica de Fernando Canto

Não sei bem em que jornal eu li sobre um maluco que morava numa praia do Rio de Janeiro, mas quem o deixou comigo foi meu amigo RT na volta de uma viagem à cidade maravilhosa. O texto o descrevia como um homem corpulento, negro e barbudo, que fumava maconha, mas que não incomodava ninguém. Cumprimentava a todos e fazia parte da paisagem urbana de Ipanema. Todo mundo o conhecia no bairro e o autor do artigo falava em uma espécie de reencontro com ele depois de muitos anos que passou fora do Brasil.

Em Macapá conheci algumas dessas pessoas alienadas, praticamente abandonadas por suas famílias. E foi exatamente na minha adolescência, quando era estudante do ginásio. Na saída das aulas os mais velhos instigavam os mais novos a fazerem chacotas com elas e apelidá-las quando passavam em frente ao colégio.

Nunca esqueci a “Onça”, que possivelmente não era louca, mas viciada na cachaça. Quando convidada fazia espetáculos sensuais, levantava a saia rodada e dançava Marabaixo, sem se desvencilhar da garrafa de “Pitú’ equilibrava na cabeça, rebolando, para o delírio da turma, que a aplaudia sem parar, rindo e gritando com aquelas vozes de fedelhos em mudança, quase bivocais.

Ainda posso ver o “Cientista” lá pelas bandas do Mercado Central trajando seu paletó azul claro e um calção sujo e descolorido. A barba rala, as feições indígenas e o olhar sereno. Vez por outra procurava alguma coisa embaixo de uma ficha de refrigerante ou em uma pequena poça d’água, como se tivesse perdido algo muito valioso. À vezes anotava (ou fazia que anotava) alguma coisa em um papel de embrulho, daí as pessoas acharem que eram importantes fórmulas de um cientista, vindas em um “insigth”, um estalo de ideia. Eu o vi também trajando o pijama de interno do Hospital Geral, de onde fugia de uma ala reservada aos doentes mentais.

Quase decrépito, mas imponente, calvo e meio gordinho era o famoso “Pororoca”. Para mim é inesquecível a cena que vi dele descendo a ladeira da Eliezer Levy, no bairro do Trem, no sol quente do meio dia, bem embaixinho da linha do equador, quando os raios do sol pareciam rachar os telhados das casas e estalar a piçarra. Lá vinha ele, rindo à toa, descalço, de cueca branca e um imenso couro de jiboia enrolado no peito. Um figuraço!

Creio que todos os frequentadores do bar Xodó chegaram a conhecer o “Rubilota”, um senhor de aparência forte, que andava invariavelmente sem camisa, que pedia um cigarro e ia embora. Mas de repente surtava e começava a gritar pornofonias das mais cabeludas possíveis. Quando ficava violento era preciso chamar a polícia, mas com um bom reforço, pois ele era durão.

Quem sempre aparecia pela Beira-Rio era o Zé, cearense e empresário de sucesso, mas que enlouqueceu, dizem, de paixão. Ele me conhecia, e sempre que me via nos bares ia me cumprimentar ou pedir um cigarro. Os garçons tentavam expulsá-lo do ambiente porque andava sujo e com o pijama do hospital, de onde fugia igual ao seu colega “Cientista”. Porém eu não deixava que o escorraçassem.

Havia um cara que eu conheci ainda sem problemas psiquiátricos. Ele tocava violão e cantava na Praça Veiga Cabral, ali na parada das kombis que faziam linha para Santana. Estudava, salvo engano, no Colégio Comercial do Amapá. Anos depois eu o encontrei pelo centro da cidade cantando sozinho pela rua as músicas seu ídolo: era o Roberto Carlos de Santana.

O pessoal da sacanagem do Xodó chegava a pagar R$1,00 para ele cantar o “Nego Gato” no ouvido de algum freguês desprevenido. O RC de Santana chegava por trás da vítima (normalmente um amigo que não sabia da onda da turma) e dava um berro que até o Rei da Jovem Guarda se espantaria. Cantava “Eu sou o nego gato de arrepiar…” em alto e bom som e em seguida saía correndo com medo da porrada até a intervenção dos gozadores que morriam de rir.

Esse era o meu maluco predileto. Não sei por onde ele anda, se morreu como a maioria dos aqui citados, se ainda recebe uma grana para cantar o “Nego Gato” ou se ainda canta acreditando que é o Roberto Carlos, lá em Santana. O interessante é que as pessoas sempre têm uma explicação para a causa da desgraça alheia. Dizem que todos eles tiveram desilusões amorosas, que foram vítimas de traições, e por isso surtaram, e assim viveram e assim alguns morreram. Mas com certeza viveram bem, imersos no seu mundo, sem se importarem com que os “normais” pensassem a seu respeito, sem se indignarem com os acontecimentos inescrupulosos dos políticos indignos, estes sim, os deficientes mentais que precisam ser recolhidos definitivamente da sociedade.

*Republicada por hoje ser o Dia Mundial da Saúde Mental.

Um mergulho nesse rio de gente – Crônica de Ronaldo Rodrigues e ilustração de Ronaldo Rony

Crônica de Ronaldo Rodrigues e ilustração de Ronaldo Rony

Há algum tempo, deixei de ver o Círio passar e passei a mergulhar nesse rio de gente. Creio que há uns cinco anos, no segundo domingo de outubro, quando saio de casa para ir ao encontro dessa multidão, vou também ao encontro da memória da minha mãe, da lembrança de Belém, do cheiro do tucupi.

Também vou ao encontro de mim mesmo e, se você acha que estou usando demais a palavra ‘encontro’, saiba que é proposital. Encontro é o que o Círio, não só a procissão, mas tudo o que envolve esta época do ano, representa para mim. Penso nas pessoas que moram fora, em outras cidades, outros estados e mesmo em outros países, que viajam a Belém para se encontrar com a família, rever os amigos, respirar a cidade.

Mas nem sempre foi assim. No meu ateísmo juvenil, cheguei a renegar o Círio e tudo o que fosse ligado à religião. Com isso, feri muitas pessoas, inclusive minha mãe. Achava o máximo provocar, chocar, marcar minha rebeldia, desfiar minhas opiniões contra Deus, Jesus, Igreja, santos, cristãos, papa etc.

Ainda bem que o tempo vai nos ensinando e eu, tentando aprender com ele, sei que exagerei na dose, provoquei mágoas e, como advogado de minha própria causa, invoco a meu favor, como atenuante, os arroubos da juventude. Hoje penso com mais leveza sobre o conceito de Deus, mantenho minhas críticas ao que afronta o que entendo como religiosidade, mas o Círio está acima disso tudo, porque compreendi a tempo, minha mãe (saiba disso onde estiver), que Nossa Senhora de Nazaré é a síntese do amor de todas as mães, que o Círio inspira, irmana, reúne e congrega os mais diversos pensamentos e sentimentos referentes à força que desafia a lógica. Essa força é a fé.

Domingo estarei novamente entre os caminhantes nas ruas de Macapá, estarei com minha mãe e minha família, amigos daqui e de Belém, presencialmente ou na lembrança, na vontade de bem-querer. Nestes dias de extremos, radicalismos e intolerância, vou me juntar às orações por um Brasil e um mundo justos, fraternos e que façam valer a nossa vocação para a felicidade.

Feliz Círio de Nazaré!

*Crônica de 2018, republicada.

No Círio da Naza com o Anjo Galahell – Crônica de Ronaldo Rodrigues

Foto: Márcia do Carmo

Crônica de Ronaldo Rodrigues

“Quando eu for morrer / Vou pedir pra ser outubro / No meio daqueles anjos / Do Círio de Nazaré” (Edyr Proença / Emanuel Mattos)

Pois bem. Belém caminhou pelas ruas de Macapá de mãos dadas comigo e com o domingo. Era o Círio de Nazaré, santa protetora dos paraenses, macapaenses, marambaienses, laguinenses, gregos, troianos, baianos e tupis. Todos os peregrinos agarrados à tradição/contradição, desgarrados pelo mundo em cotidiana diáspora.

Foto: Márcia do Carmo

Belém estava tão aqui em Macapá que até choveu. Um pouquinho só, mas que choveu, choveu! E foi na companhia do Anjo Galahell que Maria de Nazaré me abrigou em sua linda berlinda.

Depois da procissão propriamente dita/bendita, uma outra procissão se fez, em busca do pato que (paciência. Alguém tem que ser sacrificado…) deveria estar boiando num oceano de tucupi, exalando aquele cheiro que… Bem. Quem sabe, sabe…

Foto: belem1000.blogspot.com

E quantas surpresas nos fizeram presas do imponderável, do milagre, da graça da Naza. O pato no tucupi não foi encontrado, estava enfeitando outras mesas. Mas ele não fez falta, já que em seu lugar (milagre da Naza) apareceu uma galinha caipira servida pelas mãos generosas da Zozó, tia do Galahell (sim! Anjos também têm família!) e agora para sempre já incorporada à minha árvore genealógica, é lógico! A galinha de quintal matou nossa fome de justiça e a sabedoria do coração da Zozó é o que a própria Naza teria me ensinado.

Belém, de hoje e de outrora, Belém da minha infância aportou definitivamente quando eu e o pastor alemão do rock caminhávamos pelas ruas de Macapá em busca novamente de comida, bebida (caramba! Será que a gente nunca se farta?) e, se não fosse pedir demais, atenção e carinho. Pois foi o que conseguimos, na figura de um astro do passado, o ex-jogador de futebol Mareco, que reconheceu Galahell, elogiou sua verve jornalística e montou a banca para que eu e o anjo nos servíssemos de geladíssima cerveja, o café da manhã dos campeões.

Fiquei emocionado ao conhecer pessoalmente Mareco, depois de tanto tempo, depois de tê-lo visto em Belém, no final da década de 1970 e começo da década de 1980, nos gramados futebolísticos, eu como espectador, ele como integrante de uma geração que fez a Cidade das Mangueiras ouvir maravilhada o rugido do glorioso Leão Azul, o Clube do Remo.

Uma geração brilhante de jogadores azulinos, como Dico, Edson Cimento, Marinho, Dutra, Darinta, Cuca, Aderson e seu irmão Mêgo (autor dos dois gols inaugurais do Mangueirão), Elias, Mesquita, Bira, Júlio César, o gigante Alcino… E por aí vai. E para ninguém dizer que estou puxando a brasa só pra minha sardinha, já que eu torcia pelo Remo, relembro alguns nomes da galeria de grandes craques que o rival Paysandu também ostentou naquela época: Aldo (irmão do Bira, ambos macapaenses), Patrulheiro, Lupercínio, Heider, Paulo Robson, Careca, Wilfredo, Evandro, Roberto Bacuri, Nilson Diabo, Tuíca, Edésio, Leônidas, Chico Spina e até o Dario – Dadá Maravilha…

Foto: Márcia do Carmo

Égua! Belém da minha infância entrou em campo de novo e o mais legal disso foi constatar que Mareco não tem nem sombra da arrogância que se vê hoje em alguns jogadores. O cara veste a camisa da humildade, o verdadeiro manto dos vencedores.

E para encerrar esta crônica ciriana nazarena, o fim da tarde e o começo da noite foram embalados pelo ritmo irmão do marabaixo, o carimbó. Pinduca, Verequete e outros mestres baixaram no terreiro e deram show, me transportando novamente para Belém e Curuçá, banhando minha alma de açaí.

Então diga aí: Belém estava ou não presente no domingo do Círio da Naza, aqui em Macapá? Milagres da Naza e do Anjo Galahell!

Naza / Nazarézinha / Nazaré Rainha / Nazaré Mãe da terra / Mãezinha / Me ajuda a cuidar” (Almirzinho Gabriel).

*Contribuição de 2013, republicada.

SELFIE – Crônica de Ruben Bemerguy

Tenho muitos vícios. O mais imperfeito deles é o vício de fumar. O mais perigoso é o vício de amar.

Imperfeitos ou perigosos os vícios me impõem a condição de servo.

Do primeiro – fumar – não raras vezes tentei me libertar, mas ainda sem êxito. Do segundo – amar – dado ao elevado grau de risco, já estou serenamente livre. É que amar mata. Segundo minhas observações, quem traga o amor como eu trago é candidatíssimo ao óbito precoce. Não há pulmão que resista a um grande amor. Melhor fumar. Fumar salva vidas.

Há outro vício. Desse, tal como o vício de amar, também permaneço liberto, ainda bem. É o vício da Selfie. Criei até uma certa antipatia pela palavra Selfie. E olhe que amo as palavras. Só a elas, inclusive.

Mas Selfie é um estrangeirismo que faz com que quem o pronuncie passe representar o mais imponente falso-culto, quando pouco. Aliás, falso-culto é uma expressão, inventada por mim e para mim, exclusiva para identificar a exata futilidade da Selfie. A verdade, é que ando com raiva das Selfie’s. Em outras palavras, falso-culto tem o sinônimo falso-mundo. É, definitivamente, uma palavra criada para me proteger dos cínicos.

Selfie é, portanto, um auto-retrato (muitas vezes um multi-retrato) onde se irradia a vaidade própria, próprio da própria desconfiança.

A Selfie nunca será um retrato. O retrato nasce em outros olhos e isso é suficiente para distanciá-lo da Selfie. A Selfie, assim, é um verdadeiro funk ostentação.

Seja como for, e por isso mesmo o falso-mundo, eu nunca me deparei com uma única Selfie triste. Selfie que chore. Selfie saudade. Selfie volte pra mim. Selfie dúvida. Selfie perdi. Selfie me perdoe, eu errei.

Só encontro Selfie triunfante. Selfie Sorridente. Selfie Forte. Selfie Valente. Selfie ouruda. Selfie Feliz.

Ontem estive com o Rio. Expliquei quanto a meu vício de fumar e de como isso tem salvado a minha vida. Ele confidenciou que também inala do mesmo vício e por essa simples razão ainda existe. Depois, respirou fundo, e molhando em suas águas o vício do amor na modalidade cem metros rasos vaticinou: “Ouça Ruben, o amor não passa de um traço feito a lápis na cortina d’água”. E olha, de amor e de água o Amazonas entende mesmo. E muito.

Já quanto ao vício da Selfie, ele – o Rio – acha tudo muito natural. Justifica ensaiando que o aperto de pés, por exemplo, é mais sagrado do que o aperto de mãos. E que nós só assistimos os apertos de mãos porque o aperto de pés só se revela na volúpia de nossas águas mais profundas e, por isso, é invisível a olhos nus. Nada mais invisível do que o aperto de pés, segundo o Rio.

Quando comprimimos os pés descalços em outros pés descalços – me disse o louco do Rio – embora ninguém veja, ninguém saiba, caminhamos exatamente para a invisibilidade dos destinos paridos no vício que mata, mas sem o qual não se vive. O tal do vício de amar.

Para o Rio, esse excêntrico excessivo, seja a selfie auto ou multi, ela – a selfie – é palavra sem gênero e só por isso estaria justificada sua existência e proliferação. Para ele, a Selfie é e sempre será um aperto de pés. O que o selfie revela mesmo ninguém vê porque não é pra ver mesmo. É assim mesmo. Pés entrelaçados. Palmas enlouquecidas. Dedos em riso.

A Selfie é desse modo. Só anota que os pés existem, mas o aperto de pés é caligrafia que só se decifra no vício de amar.

Me despedi do Rio e ri. Ri muito. Costumo rir dos Rios. Me diz o Rio que o vício de amar é efêmero e quer me fazer crer nele e em Selfie. Ora veja!

Arranquei um cigarro do bolso esquerdo, acendi a luz que me salva a vida e segui. Simplesmente segui.

*RUBEN BEMERGUY é advogado e membro da Academia Amapaense de Letras

Fonte: Blog da Alcinéa.

3ª paróquia mais antiga do Amapá, Igreja de Nossa Senhora da Conceição realiza programação para custear reforma

Por Rafael Aleixo

A Paróquia de Nossa Senhora da Conceição, no bairro do Trem, em Macapá, vai realizar uma programação especial voltada para o levantamento de fundos para a reforma do prédio. A igreja é a terceira mais antiga do Amapá, sendo mais nova apenas do que a Catedral Histórica de São José e a paróquia de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, localizada no bairro da fazendinha, também na capital.

O padre Hilbeberto Carneiro informou que iniciou uma campanha em setembro do ano passado para arrecadar fundos para reformar o telhado, que foi todo trocado. Na época, todos os parafusos foram impermeabilizamos com manta asfáltica, assim como pintados com tinta emborrachada.

A história da igreja está ligada ao crescimento do bairro. A paróquia erguida a partir do empenho do padre Francisco Cocco, que até os dias atuais é tido como um ícone no bairro.

“A paróquia ficou famosa justamente pela sua famosa torre com seus quatro sinos. Esta paróquia tem toda uma simbologia para este bairro. Os moradores mais antigos comentam que muitos ajudaram, literalmente, a carregar pedras e tijolos para levantar esta comunidade”, descreveu o padre.

Os itens incluídos na lista para reforma são: instalação elétrica, capacitando para comportar 12 centrais de ar; compra de transformador; poste; fazer subestação; colocar vitrais e portas de vidro; troca de piso; recuperação do altar; pintura interna e externa; instalação de placas solares e; revitalização e reparo dos sinos.

Para ajudar a arrecadação, a paróquia realiza rifas e terá a partir das 19h do dia 13 de outubro um show beneficente “Meu Acampamento” com o Thiago Brado.

O show terá ainda a participação da Banda Eterna Aliança e Ministério de dança do Shalom.

Veja as datas históricas da igreja:

03/12/1949 – Dedicação da primeira Capela a N.Sra da Conceição
03/07/1950 – Início da construção da segunda Capela, uma vez que a primeira foi derrubada por um forte temporal
03/08/1950 – Celebração da primeira missa, na nova Capela, presidida pelo Pe Antônio Cocco.
01/05/1950 – Lançamento da pedra fundamental da Igreja atual
27/05/1954 – Benção e entronização da Imagem de N.Sra da Conceição, por Dom Aristides Pirovano, Bispo prelado de Macapá
30/05/1954 – Benção e inauguração da Igreja de N.Sra da Conceição e celebração da primeira Santa Missa, presidida por Dom Aristides Pirovano e concelebrada pelo Pe Antônio Cocco e demais padres da Prelazia

Fonte: G1 Amapá

Ilha de calor – Crônica de @rebeccabraga

Belém – PA – Foto: Elton Tavares

Por Rebecca Braga

Era por volta das 10 da manhã quando cheguei em casa. Um gole longo de água. Subi as escadas até o andar superior enquanto tirava a roupa e largava em cima da cama.

– Como é quente esta cidade. – Falo pra mim mesma.

Sempre achei que Belém fosse mais quente que Macapá. Deve ser porque, quando criança, ouvi alguém dizer que:

– Belém é uma ilha de calor.
-Ilha de calor?
– Sim. Sabe quando o ar quente fica dentro da cidade? Deve ser por causa dos prédios…
– Ah, entendi. Deve ser mesmo.

Pesquisei o que é uma ilha de calor. Não é E-XA-TA-MEN-TE isso, mas quase. Então serve, por enquanto.

Macapá – AP – Foto: Elton Tavares

Quando me perguntam se Belém é mais quente que Macapá, sempre digo que tenho essa impressão, mas que deve ser porque eu me acostumei em morar numa cidade que tem uma orla por onde se pode andar de um lado a outro da cidade vendo o Rio Amazonas, não uma paisagem, mas um elemento que não se pode ignorar. O vento, o som, o cheiro. Tudo que vem dele habita os dias.

Em Belém, a orla tem portos prédios lojas aos montes. E num lugar ou outro você vê a sombra de um Guamá no fundo e nesse ou naquele lugar é possível sentar à beira do rio. Sinto falta do passeio de carro olhando o rio que quando seca vai longe da margem e deixa nu um chão de areia e lama, com cheiro úmido de água doce e esgoto.

Rio Amazonas – Macapá – Foto: Floriano Lima

Não se trata de ser um melhor que outro. Trata-se de que são diferentes, e me despertam diferentemente.

Também acho Belém mais úmido. E isso acho por causa dos três dias que a roupa leva pra secar, se não chover e ela secar e molhar várias vezes, até perder o cheiro de cachorro molhado, como diria… não lembro exatamente quem.

Foi minha mãe que me chamou atenção pra isso. Sinto saudades de minha mãe. Ela sempre tem um cheiro fresco de pele recém lavada. Sinto falta do som que os passos dela fazem.

Belém é uma cidade violenta. Não preciso dos dados pra dizer, mas você pode conferir.

Andando na rua tenho medo de assalto, mas em certo período do ano tenho mais medo de manga. Sim, de uma manga cair na minha cabeça. Acho que uma manga pode matar alguém, ou fazer um bom estrago.

Ver-o-Peso – Belém (PA) – Foto: Luiz Braga

A rua onde moro tem casarões antigos. É a parte velha da cidade. Se eu caminhar pra minha esquerda, até o fim, chego no rio, e no Ver-o-peso. Lá o cheiro é forte de patchuli, maniva e cocô de galinha. Mas não só isso. Cheira a peixe frito, açaí do grosso, farinha baguda. Fala-se alto, é preciso se ouvir entre as bicicletas com alto falantes que tocam os bregas clássicos e vendem pendrives com centenas de flashbacks. – Só os melhores, freguesa!

Se eu andar pra direita chego ao antigo presídio da cidade. Lá tem loja pra turista, um polo joalheiro e um museu que guarda objetos que os presos usavam pra seviciar os desafetos. Senti um profundo mal estar nesse lugar. Também tem uma capela linda. Deve ser de São José. Curiosamente, padroeiro de Macapá.

Curioso mesmo é que esse texto nasceu não para comparar Belém com Macapá, o que acho tedioso quando me pedem pra fazer. Mas porque acordei de um cochilo inapropriado nessa manhã. Molhada de suor e pensei que Belém era muito quente, e muito úmida, como uma vagina excitada. Ou como várias vaginas excitadas. De tamanhos e formas diferentes. Pingando. Crescendo. Pulsando em gozo frenético e violento. Minha Belém é uma vagina excitada.

Sete anos sem o mestre Tagaha Luz – Para não esquecer do velho amigo

Há exatos sete anos, em um domingo, 26 de setembro de 2016, o jornalista Tagaha Soares Luz partiu num rabo de foguete e subiu para as estrelas. Ele foi um dos maiores que conheci no jornalismo e um dos melhores amigos que fiz nessa profissão. Pai, filho e avô amoroso, humanista, escritor, poeta, músico e excepcional profissional, ele era um cara PHoda.

Meio índio, meio caboclo, natural do Pará e amapaense de coração, Tãgaha, nome de pássaro dado ao Raimundo pelos índios de Oiapoque, era a sabedoria na simplicidade, admirável. O querido Tãga partiu com 50 anos de vida, muita vida. Vítima de um infarto.

No início de 2011, em meio a um turbilhão de acontecimentos, comecei a trabalhar com várias figuras porretas. Algumas me ajudaram a melhorar como profissional (e fazem isso até hoje). Um deles foi Tãgaha. Aliás, ele foi senhor deste nobre ofício. A amizade com o cara surgiu de repente, por meio do trampo. Suas atitudes, integridade e honradez logo me chamaram a atenção.

O homem é justo e do bem. Para mim foi conselheiro, revisor, meio pai, meio irmão e exemplo de profissional. Mas parecia que conhecia o Tãga a vida toda, de tanto respeito, admiração e consideração que tenho por ele. Nunca o vi sacanear alguém.

Aliás, Tagaha foi o primeiro a me incentivar a escrever um livro, de tanto que o cara acreditava em mim. Gratidão sempre por isso.

Não sei de que planeta ou dimensão o Taga veio, mas ainda bem que ele pintou aqui e alegrou nossas vidas. Todas as vezes que precisei, o cara me auxiliou. Sei que o cara foi genial, com um talento ímpar e com um coração maior que ele. O velho índio louco era feito de talento e amor. Amor pelos filhos, pelos amigos, pelos colegas de trabalho e pela profissão de jornalista.

Tãga deve, vez ou outra, tomar umas com o Paparazzo, no boteco celestial da dona Euda.

A gente, seus amigos, tem uma baita saudade daquele sacana. Mas somos gratos por tê-lo conhecido, convivido e termos sido amigos do baita cara que ele foi nessa passagem por aqui. Tãgaha Luz não iluminou somente o meu caminho, mas o de todos com quem conviveu.

Até a próxima vez, amigo!

Elton Tavares

Fotógrafa Márcia do Carmo gira a roda da vida. Feliz aniversário, Marcinha! – @carmomarcia

Ser jornalista fez com que eu conhecesse pessoas realmente fantásticas ao longo destes anos de trajetória. E tive a sorte de trabalhar com vários dos melhores profissionais do Amapá. Além de competentes, alguns se mostraram ser pessoas extremamente porretas. É o caso da fotógrafa Márcia do Carmo, que gira a roda da vida hoje. E como ela é uma irmã de vida deste editor, rendo-lhe homenagens.

Marcinha é uma filha zelosa, tia amorosa, amiga prestativa, umas das melhores profissionais da fotografia com quem já trabalhei, fotojornalista de olhar aguçado, cineasta, publicitária, empresária, trabalhadora e batalhadora, além de muito querida amiga deste editor.

Super competente, braba e intrépida, Marcinha é uma pessoa pequena, mas de um talento imenso e um coração gigante. Uma mulher honesta e de caráter, coisa que não podemos dizer de muitos. Ela é uma figura do bem (quando você não é um desafeto) e uma das grandes amigas que fiz nessa profissão.

Minha amizade com Márcia do Carmo foi forjada debaixo de sol e chuva, durante anos de trampo. Já contei aqui e repito que: com ela já fiz viagens malucas em que cobrimos diversos tipos de pautas e em condições adversas. Nós caminhamos na lama, dividimos comida e cervejas pelas estradas e bares do Amapá. Dormimos em carros, barcos e hotéis de qualidade duvidosa. E acreditem, isso são lembranças lindas.

A gente se respeita, gosta e se ajuda. Sei que posso contar a Marcinha, pois ela já deu provas disso diversas vezes. Essa “retrateira” boçal mora no coração deste gordo e acredito ser recíproco.

Marcinha é uma amiga com quem posso contar e é recíproco. Já provamos isso. Claro que já nos encaralhamos diversas vezes um com o outro vezes ao longo dos anos, mas isso faz parte de qualquer relação. Ainda mais em uma amizade de mais de uma década. Ah, ela chega aos 60 setembros com aparência de 50, pois a pequena grande mulher tá enxutaça!

Do Carmo, tu sabes o quanto te admiro e respeito. Que tu sigas com saúde sempre e congelando momentos com esse teu feitiço fotográfico. Que a gente ria e beba muito juntos nesta vida, por pelo menos mais uns 60 anos. Tu és foda, considerada e amada.

Obrigado por tudo. Parabéns pelo teu dia e feliz aniversário!

Elton Tavares

Se ainda estivesse por aqui, papai faria 73 anos hoje (Para jamais esquecermos do Zé Penha)

Meu irmão e papai, em 1996.

No dia de hoje (17), se meu saudoso pai estivesse entre nós, faria 73 anos. Antes eu dizia “se estivesse vivo”, mas ele está, dentro de nós, por isso, ainda é seu aniversário. É difícil definir um modelo de vida, acredito que cada um vive da forma que lhe é aprazível. José Penha Tavares viveu tudo de forma intensa e foi um homem muito feliz. Eu sigo seu exemplo e sou muito feliz.

O mais legal é que ele nunca fez mal a ninguém, sempre tratou as pessoas com respeito e foi muito amoroso com os seus. Meu irmão costuma dizer que ele nos ensinou o segredo da vida: “ser gente boa” (apesar de alguns gatos pingados não comungarem desta opinião sobre mim).

Eu, papai e Clara (sua namorada), em 1997.

Quando o bicho pega, falo com ele. Uma espécie de monólogo, mas juro que sinto conforto em lhe contar meus raros problemas. Acredito que papai escuta e, de alguma forma, me ajuda. Devaneio? Não senhores e senhoras, é que aquele cara foi um grande pai, ah se foi. Portanto, deve mexer os pauzinhos lá por cima.

Ele partiu em 1998, faz e fará sempre falta. Sinto saudade todos os dias e penso nele sempre. Nosso amor vem das vidas passadas, atravessou esta e com certeza a próxima. Gostaria de lhe dar um abraço hoje, desejar feliz aniversário e tomar muitas cervas com o Penhão, como costumávamos fazer.

Nós e o Zé Penha, em dezembro de 1997, no último natal dele conosco.

Republico este texto para o Zé Penha jamais ser esquecido. Não por mim, pelo meu irmão ou os irmãos dele, que nunca o esquecemos, mas sim pela legião de amigos que ele fez durante sua breve jornada por aqui. Faço minhas as palavras do poema Filtro Solar: “dedique-se a conhecer seus pais. É impossível prever quando eles terão ido embora, de vez”. Saudade, Penhão. Feliz aniversário, papai!

Elton Tavares